EdT 42 — O n.º 12 da Place Vendôme, em Paris, esconde uma sala a que a Chaumet chama «Salão de Diademas». Fixados como borboletas sobre as paredes, as maquetas em alpaca são hoje o testemunho do passado e do presente de uma casa que continua a brilhar intensamente.
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Publicado na edição de verão de 2013 (número 43) da Espiral do Tempo.

A fortuna e a reputação podem surgir de forma inesperada. No caso dos fundadores da Maison Chaumet, a atribuição do título de joalheiros de Sua Majestade, o imperador e rei de França, trouxe-lhes um reconhecimento para o qual Marie-Étienne Nitot e o seu filho François Regnault estavam bem preparados. A absoluta necessidade de Napoleão Bonaparte afirmar o seu poder no período que mediou os séculos XVIII e XIX levou-o a construir, ao redor da sua família, uma verdadeira aura real, destinada a transformar os recém-chegados ao poder em dignos representantes de uma dinastia imperial que arrastava atrás de si uma hierarquia de súbditos decalcada da antiga e defunta monarquia. As cerimónias na corte passaram a revestir-se de um esplendor extremo e garantiram a Nitot a encomenda de joias destinadas a fazer distinguir a família imperial da multidão que se acotovela nos salões onde decorriam as coroações, os casamentos, as visitas de estado e os bailes da corte. É durante este período que a tiara e particularmente o diadema, com a capacidade que têm de atrair o olhar para si, se impõem e se transformam num símbolo de autoridade e de precedência.

O diadema deste período é a encarnação do estilo império na joalharia, tal como imaginado pelos arquitetos Charles Percier e Pierre Fontaine, e, tal como muitas expressões artísticas da sua época, inspira-se na antiguidade. Oferecido aos vencedores dos torneios atléticos da Grécia antiga e do império Romano, a coroa em forma de diadema ou a banda estreita usada sobre a fronte acabariam por ser adotadas por Roma como símbolo de poder absoluto, tornando-se indissociáveis da imagem do imperador e da imperatriz. Inspirado por este passado, Napoleão decide dar uma nova vida ao diadema com a imperatriz Josephine e posteriormente com Marie-Louise. Um exemplo que todas as damas da corte acabam por seguir e que fez a fortuna dos fundadores da Chaumet. Sob a influência do império os diademas de Nitot vestem-se de pérolas e pedras preciosas, com particular incidência no diamante, que, usado sobre a cabeça, tem a capacidade de captar a luz e de a devolver com intensidade aos súbditos.

Napoleão tinha encorajado de tal forma a arte da joalharia, transformando-a numa eficaz expressão de poder, que mesmo o fim do seu regime acabaria por não gerar nenhuma crise entre os joalheiros parisienses. Com efeito, o regresso dos Bourbons e a vitória das potências aliadas acabariam mesmo por incutir um desejo de rivalizar com o império. Jean-Baptiste Fossin, sucessor de François-Reglaut Nitot em 1815, dá continuidade ao prestígio adquirido até então, mas ganha uma reputação internacional acrescida graças a um estilo totalmente novo, expresso através de joias verdadeiramente magníficas. À vantagem de ser chefe de atelier junta-se a experiência de ter executado as grandes encomendas imperiais de Nitot, o que lhe permite criar um novo género de diademas de estilo naturalista, que revitaliza um dos grandes temas joalheiros do antigo regime. Com uma mão firme, o joalheiro reproduz folhas de hera, de oliveira e de castanheiro, flores de madressilva, espinheiro-alvar, jasmim, gerânio, catos e ainda frutas como as uvas ou as cerejas. As flores são montadas en trembleuse, para que oscilem ao mais leve movimento.

A Faussin sucede-se Prosper Morel, e, por volta de 1860, a temática naturalista vê-se integrada em estruturas simétricas de dimensões imponentes. Padrões do século XVIII, como as treliças, os nós e as fitas laçadas, fazem o seu regresso provavelmente devido à paixão da Imperatriz Eugénia pelo período de Maria Antonieta. Em 1875, a filha de Morel casa com Joseph Chaumet dando início a uma nova era para a casa parisiense. Apesar de ser um apaixonado pelas pérolas, Chaumet aprecia particularmente os rubis assim como outras pedras preciosas que escolhe de acordo com a pessoa que as deverá usar. A sua principal clientela é a aristocracia tão bem retratada por Marcel Proust na sua obra À la Recherche du Temps Perdu. Os diademas de Chaumet atravessam o canal da mancha, e, em 1898, a Illustrated London News escreve que «as joias de família herdadas são mesmo eclipsadas por uma profusão de diademas sem o menor passado». Mas por França, e com o advento da república, há já quem escreva que «o uso do diadema já não é compatível com o atual estado e política do país».

No entanto, com o início do século XX, os diademas mantêm a sua presença em todas as monarquias e começam mesmo a transcender o seu domínio. A revista inglesa Tatler relata em 1909 que se, até então, o diadema estava apenas reservado aos membros da família real e mulheres de embaixadores, «agora ele é usado em todo o género de ocasiões surpreendentes. Veem-se, atualmente, no teatro, em pequenas receções e jantares em restaurantes. A esposa moderna espera receber pelo menos dois diademas como prenda de casamento, e quatro ou cinco nas bodas mais elegantes». Para responder a esta procura, Chaumet decide abrir uma sucursal em Londres em 1905, o mesmo ano em que decide mudar da Rue de Rechelieu para a famosa 12, Place Vendôme frente ao Ritz e perto dos costureiros e restantes joalheiros de primeira linha. Apesar de manter a sua inspiração na arte dos reinados de Louis XV e XVI, os diademas que cria são agora bastante mais leves e finos graças à resistência da platina que se começa a impor como metal de eleição, e ao uso de pedras calibradas, talhadas especificamente para a dimensão necessária.

A moda feminina evolui e, influenciada pelo costureiro Paul Poiret, prefere render-se às mil e uma noites do que ao estilo imposto pelo Petit Trianon de Maria Antonieta. Chaumet deixa-se também influenciar pelo oriente e pela arquitetura islâmica com os seus arcos interrompidos, assim como pelo Japão com os ramos de cerejeira em flor. A partir de 1918, as joias passam a ter de ser compatíveis com os novos cortes de cabelo e o estilo introduzido por Chanel e Lelong, com a Vogue a afirmar que «não há qualquer dúvida de que a joalharia é de uma absoluta necessidade para a moda moderna».

Apesar do desaparecimento de diversas monarquias neste período, o diadema não é considerado um adorno obsoleto repartindo-se agora o seu estilo entre tradicional, romântico e chique contemporâneo. Mesmo assim, Chaumet propõe alternativas modernas caracterizadas por uma simplificação de linhas, uma preponderância de formas geométricas, contraste de cores entre opacos e translúcidos, gemas em cabochão e lapidadas. A descoberta do túmulo de Tutankhamun em 1922 estimula a adoção de novos temas decorativos de inspiração egípcia e oriental e a banda, que como o diadema se usa sobre a fronte ‘à la Josephine’, alcança um tal sucesso que o seu uso passa a ser considerado como ‘de rigueur’ durante as soirées privadas.

Marcel Chaumet sucede ao seu pai em 1929 e herda um período difícil saído da Grande Depressão, vendo-se, no entanto, apoiado pelos seus clientes parisienses que continuam a brilhar na ópera e em outras receções. O diadema dos anos 30 abandona a fronte para se posicionar novamente sobre a cabeça e continua a ser usado durante as noites do Metropolitan Opera, em Nova Iorque, enquanto a Europa adormece para um conflito do qual apenas acordará em 1947 para o casamento da futura rainha Isabel II com o príncipe Philip de Mountbatten. A sucessão de décadas que se segue até aos nosso dias vem consolidar a posição da Chaumet como um caso impar na história da joalharia ao manter a tradição de uma joia sublime que continua a ser usada em casamentos onde a noiva se veste como que para uma coroação. O diadema nunca deixou, afinal, de ser uma joia moderna.

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