Competições cronométricas de Le Locle 2019: quem se atreve?

Irão ser 80 dias de testes rigorosos, empreendidos por quatro instituições acreditadas pela Confederação Suíça. No final, só pode ganhar uma por cada categoria. É o regresso, para 2019, das prestigiadas Competições Cronométricas cuja ausência tem impedido a separação do trigo do joio.

Arthur Hofer e Bernard Huguenin para a Nivarox, André Brillanz para a Omega, Jean-Pierre-Sunier e René Gygax para a Zenith, Fernand Wenger para a Longines ou Léopold Berthoud para a Ulysse Nardin. Estes nomes eram sobejamente famosos até meados da década de 1970, e representavam uma elite entre as elites de relojoeiros a trabalhar na Suíça. Era a eles que cabia a fastidiosa tarefa de regular o funcionamento de um movimento mecânico até para além do limite do possível. 

Mecanismo para os testes do Concurso de Cronometria
Mecanismo para os testes do Concurso de Cronometria.

Conhecidos como “regleurs”, as manufaturas atribuíam-lhes a honra de preparar os movimentos que iriam ser submetidos aos exigentes testes dos concursos de cronometria organizados anualmente pelos principais Observatórios Astronómicos como Neuchâtel, Genebra, Besançon (França) ou Kew (Reino Unido). Um bom resultado nestas competições podia representar, ao longo da primeira metade do século XX, a diferença entre o sucesso e a insolvência, tal era a importância dada pelo público à robustez e precisão. Um aspeto essencial neste período e que era devidamente refletido pelas principais marcas nos anúncios que publicavam nos meios de comunicação.

Mas com o desafio do surgimento dos mecanismos eletromecânicos e, posteriormente, dos movimentos a quartzo, os níveis de precisão ultrapassaram definitivamente a fasquia que demarcava a relevância das competições cronométricas. Como resultado, a partir de 1973/74 os concursos extinguiram-se e as melhores marcas passaram a argumentar com base noutras caraterísticas. Este hiato, com o inicio do milénio, foi parcialmente substituído pelo COSC e por certificações próprias que, naturalmente, sempre padeceram da ausência de supervisão por parte de qualquer entidade externa ou comprovadamente isenta neste processo.

Mecanismo para os testes do Concurso de Cronometria
Mecanismo para os testes do Concurso de Cronometria.

Hoje, a maioria dos colecionadores tem uma fraca ligação emocional com as incríveis realizações tecnológicas da relojoaria eletrónica, sejam relógios de quartzo, atómicos ou as versões rádio-controladas que hoje fazem parte do quotidiano da vida no século XXI. O que cativa e surpreende muitos dos apaixonados pela relojoaria é o conceito de artesanato em miniatura associada ao imaginário que materializa mestres relojoeiros a trabalhar pacientemente nos seus pacatos ateliers, longe do bulício das cidades, tentando arrancar o último décimo de segundo dos seus fascinantes instrumentos de medição. 

Mas novos métodos e materiais de construção, escapes e lubrificantes mais avançados, vieram dar aos atuais fabricantes de cronómetros um novo arsenal para lidar com as exigências da precisão mecânica. Assim, finalmente, em 2009, e passado meio século sobre a extinção dos concursos de cronometria, o Museu de Relojoaria de Le Locle decide voltar a organizar uma competição similar para o que conta com a inscrição inicial de 13 entidades que concorrem com 16 medidores do tempo.

Philippe Fischer, presidente do Concurso Internacional de cronometria
Philippe Fischer, presidente do Concurso Internacional de Cronometria.

E quando, por sua vez, este acontecimento se prepara para comemorar uma década, a Sociedade Suíça de Cronometria (SSC) em associação com a cidade de Le Locle acaba de anunciar a organização de uma nova Competição Internacional de Cronometria para 2019 na qual irão participar quatro entidades de prestígio indiscutível: o COSC, sediado em Le Locle, a Fundação TimeLab em Genebra, os laboratórios Dubois (Chronofiable) em La Chaux-de-Fonds e, finalmente, a METAS, o eminente Instituto Federal de Metrologia Suíço.

Foi no já longíquo ano de 1936 que saiu das mãos de André Brillanz o mecanismo de 19 linhas do Calibre 47.4 que  bateu todos os recordes na sua classe nas competições de Kew. O histórico exemplar da Omega obteve a marca de 97,8 em 100 pontos possíveis. Uma fasquia nunca antes alcançada e, desde então, nunca batida.

Mecanismo para os testes do Concurso de Cronometria
Mecanismo para os testes do Concurso de Cronometria.

Como herdeira de uma das mais fascinantes e prestigiosas tradições relojoeiras, esta competição não irá permitir a interferência de qualquer apreciação humana. Trata-se de um concurso que tem a ambição de ser a expressão científica da ciência da cronometria, ou seja, a busca contínua pela inalcançável precisão absoluta. Uma espécie de Graal que, em última instância, irá revelar os sucessores dos nomes enunciados no início.

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