Venda direta: o contra-ataque dos retalhistas

Nos últimos meses são cada vez mais audíveis várias declarações de responsáveis das principais marcas de relógios da indústria suíça sobre a aposta mais sólida no comércio digital e, também, na sua intervenção direta no mercado de rua. O que, de uma forma ou outra, vem abalar um pouco a tradicional relação entre as marcas e os distribuidores e revendedores que, ao longo de longas décadas, estabeleciam a ligação com o cliente final. 

A mudança do comportamento dos compradores está também a fazer com que este debate se torne mais importante. Mas estas ideias de responsáveis das marcas está agora a encontrar a reação dos retalhistas.

Isso, para já, é mais visível nos mercados do Reino Unido e dos Estados Unidos. Diversos dos mais conhecidos retalhistas de ambos os lados do Atlântico, que têm sido instrumentais no sucesso das marcas nesses mercados, têm feito coro contra as novas orientações estratégicas. Por exemplo, a Pragnell, que tem lojas em Londres, Leicester e na sua cidade natal de Stratford-Upon-Avon já fez saber que as suas decisões sobre as marcas em que irá apostar junto dos consumidores serão influenciadas pela estratégia que estas tenham definido para a área de vendas. Depois de ter expandido o seu negócio na última década, a Pragnell, fez uma análise do seu ‘portefólio’ de marcas e decidiu deixar de trabalhar com a A. Lange & Söhne e com a Audemars Piguet. A primeira abriu uma boutique de marca própria no início de 2019 em Londres. E a Audemars Piguet tem referido, nos últimos anos, que pretende que os seus relógios sejam vendidos, cada vez mais, através das suas próprias lojas. Este ano deverá abrir a primeira AP House em Londres. A Pragnell, que funciona como revendedor autorizado da Rolex e da Patek Philippe, aponta como exemplo de sucesso as marcas que não tentam fazer concorrência direta aos seus parceiros para vender diretamente. Um responsável da empresa referiu à revista WatchPro que: «As decisões que as marcas fazem com as suas estratégias afetam inevitavelmente as nossas escolhas sobre com quem deveremos trabalhar. As marcas que não têm uma estratégia de venda direta parecem ser as que têm mais sucesso a nível da indústria. Há um crescente reconhecimento de qual é o mais sólido caminho. Depende de onde estás no mundo, da qualidade do retalhista e da natureza da marca. Muitas marcas estão a perceber que a distribuição direta raramente é a mais efetiva.»

Nos Estados Unidos, a Hyde Park Jewellers, que opera lojas multimarcas em Denver, Phoenix e Newport Beach (Califórnia), para além de boutiques de marcas únicas feitas em parceria com a Rolex, IWC, Breitling e Hublot, refere que abrir locais que as ligam diretamente ao consumidor é bastante caro, complicado e, raramente, tem tanto sucesso como os executivos suíços julgam. Este grupo refere mesmo, também em declarações à WatchPro, que algumas marcas que tinham estratégias ‘agressivas’, começam a reavaliar as suas decisões. Algumas já terão mesmo fechado algumas lojas próprias ou a diminuir a sua expansão nos Estados Unidos. «Perceberam que não é tão fácil como parece», acrescenta a Hyde Park Jewellers. Nos últimos dois anos, com a evolução dos resultados do mercado, algumas marcas terminaram a sua associação com retalhistas ou entraram em competição direta com eles. Isso permitiu às marcas controlar as transações os consumidores de uma forma mais concreta (criando também bases de dados sobre eles) e ficando também com margens comerciais superiores. Só que o custo desse envolvimento direto também é enorme como defendem os retalhistas, que em sua defesa apresentam o grau de conhecimento pessoal e histórico que têm dos seus consumidores.

Para os retalhistas quando o mercado abrandar, far-se-ão as contas e testar-se-ão definitivamente os resultados das marcas que apostaram na venda direta.

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