José Carlos Saldanha (1965-2020)

José Carlos Saldanha faleceu esta madrugada. Verdadeiro apaixonado por relojoaria vintage e um dos maiores especialistas em Omega, era também um grande colecionador de relógios da marca suíça. Mas fora o seu percurso nesta área, foi sobretudo um lutador no despertar das consciências relativamente ao apoio devido pelas entidades públicas e governamentais à doença de que padecia.

José Carlos Saldanha faleceu esta madrugada. Natural de Moçambique, era uma das personalidades de referência da relojoaria vintage em Portugal e um dos maiores especialistas e colecionadores mundiais de relógios Omega.

Tinha uma loja em Lisboa dedicada a relojoaria vintage, um « local de “peregrinação” dos amantes da relojoaria mecânica, nacionais e estrangeiros, dado que a sua fama começava a espalhar-se para fora do país», como refere Estação Cronográfica, site onde se pode mesmo ler uma entrevista que nos parece obrigatória.

© Paulo Pires / Espiral do Tempo
José Carlos Saldanha em exclusivo para a Espiral do Tempo. © Paulo Pires / Espiral do Tempo

Mas, fora o seu percurso no mundo dos relógios e respeito granjeado um pouco por todo o mundo, podemos dizer que José Carlos Saldanha foi sobretudo um herói no despertar das consciências relativamente ao apoio devido pelas entidades públicas e governamentais à doença de que padecia. Graças à sua intervenção no Parlamento em 2015,  a esperança de vida e de cura de muitos doentes de hepatite C aumentou.

A sua memória perdurará junto de todos os que o conheceram. Inclusive junto da equipa da Espiral do Tempo.

Aqui para nós, fica a lembrança do sorriso fácil, da boa disposição contagiante, do entusiasmo com que falava de relógios e a da sua disponibilidade para colaborar sempre que possível. E é precisamente com a sua presença recente na Espiral do Tempo que lhe prestamos a nossa homenagem.

Efetivamente, no número 68 da nossa edição impressa (outono 2019) e tendo como ponto de partida a trilogia Back to the Future, convidámos diversos especialistas da relojoaria a apresentarem o seu testemunho face à evolução do setor desde o advento da película de Robert Zemeckis, em 1985. Entre os especialistas, esteve José Carlos Saldanha. Como não poderia deixar de ser.

© DR
José Carlos Saldana, na exposição sobre a Omega que decorreu recentemente no museu do relógio.© DR

Aqui ficam as suas palavras recentes como um retrato de quem esteve apaixonadamente na indústria durante mais de 30 anos:

«Tendo em conta o tema desta edição (Regresso ao Futuro) e, simultaneamente, enquadrando-me como expert de relógios de coleção, mas propriamente os relógios vintage, entendo e vejo este mundo como estando sempre num constante movimento e evolução. Sendo assim, no meu caso, terei de vos fazer viajar no tempo, mas uma viagem ao passado.

Faz mais de 30 anos que este mundo me fascina e, tal como acontece com os meus clientes, não são as peças em si, mas toda uma envolvência, nomeadamente, as histórias a que se associa, a época a que correspondem, por onde passaram — enfim, até onde a nossa imaginação nos possa transportar.

Hoje em dia, estes objetos já não são apenas vistos como objetos de culto por parte de quem os adquire. Nas duas últimas décadas, o negócio deixou de estar confinado apenas aos dealers e pequenos estabelecimentos dedicados a este mercado, passando-se a observar a existência de cada vez mais casas leiloeiras especializadas no negócio, e é aqui que podemos perceber o quanto o marketing e as novas tecnologias catapultaram os relógios vintage (e não só) para um patamar por nós nunca imaginável.

© Paulo Pires / Espiral do Tempo
© Paulo Pires / Espiral do Tempo

Por outro lado, o nível de exigência por parte dos colecionadores e investigadores é cada vez maior em consequência da informação e fóruns da especialidade que abundam nas redes sociais e na Internet em geral. O espírito que move esta franja da sociedade, cada vez mais dilatada, prende-se pelo fascínio de marcar pela diferença e transmite aquilo que carateriza um verdadeiro colecionador. Além disso, como qualquer bem tangível, este mundo é cada vez mais encarado como uma forma segura de acautelar quem aqui investe os seus capitais.

Para finalizar, não queria deixar de realçar a importância que o espírito do colecionismo aqui assume, a ponto de as marcas com tradição começarem a apresentar nas suas coleções as reedições dos modelos antigos, bem como séries limitadas e comemorativas, conferindo um espaço dedicado e direcionado a um público específico e reconhecendo o quanto pode ser relevante na sua faturação. Tal opção faz mesmo gerar uma procura muito maior por parte desta nova geração de colecionadores.

E, desta forma, abre-se mais uma janela para o futuro….»

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