Uma marca contemporânea inspirada por um passado clássico que usa calibres de época pertencentes a um acervo histórico. Essa pode ser uma definição sucinta da nova companhia relojoeira batizada em honra de Gerd-Rüdiger Lang, mas há muito mais para contar e um primeiro relógio a apresentar: o Field Watch Edition One.
Em Tegernsee | Há um versículo da Bíblia (2 Coríntios, 5:17) que diz “as coisas velhas já passaram, eis que tudo se fez novo”. Uma frase frequentemente adaptada para “e do velho se fez novo” — e que pode ser utilizada para melhor explicar a génese da marca Lang 1943, recentemente apresentada no sul da Baviera a um núcleo muito restrito de amigos do homem que a nova companhia relojoeira pretende homenagear: Gerd-Rüdiger Lang.

Sim, ainda estamos numa fase em que a inspiração vintage e a tendência rétro pesam sobremaneira nos mais diversos sectores da moda. Sobretudo no campo da relojoaria, o regresso ao passado tem sido uma constante ao longo da última dúzia de anos graças a contínuas reedições e reinterpretações. A Lang 1943 vai por esse caminho, mas através de um trilho diferente: se a estética evoca um pretérito perfeito, a mecânica é mesmo retirada do antigamente.

Porque todos os seus relógios serão equipados com movimentos históricos pertencentes ao incomparável acervo de Gerd-Rüdiger Lang, devidamente preparados e atualizados para corresponderem às mais elevadas exigências técnicas contemporâneas. Como sucede com o Field Watch Edition One, o modelo de estreia da marca.
Por trás de um nome
Mas afinal quem é Gerd-Rüdiger Lang? Para já, convém esclarecer que o nome não tem nada a ver com a A. Lange & Söhne, nem com a mais recente Lang & Heyne — embora a origem seja igualmente germânica. E que é um nome com muito pedigree na relojoaria, conhecido mesmo antes do renascimento da A. Lange & Söhne em 1994 e do estabelecimento da Lang & Heyne em 2001. Gerd-Rüdiger Lang era o braço direito de Jack Heuer nos tempos em que a Heuer foi pioneira do patrocínio nos desportos motorizados entre as décadas de 60 e 70. Foi mesmo ele quem viajou até ao sul de França com vários cronógrafos Heuer para que Steve McQueen finalmente escolhesse usar o Monaco no filme Le Mans.

Foi Gerd-Rüdiger Lang quem, face ao advento da tecnologia de quartzo e à avalanche asiática de relógios digitais, percorreu a Suíça e a Alemanha para comprar todos os movimentos mecânicos que ainda não tinham sido deitados para o lixo ou para os lagos. Foi também ele quem fundou a marca Chronoswiss para preservar os ideais da relojoaria mecânica nesses tempos em que o quartzo era o futuro e quem teve a ideia de dotar todos os seus relógios de um fundo transparente em vidro para exaltar os mecanismos tradicionais.

Gerd-Rüdiger Lang está atualmente com 79 anos e a sua saúde tem-se deteriorado. Georg Bartkowiak, um veterano da indústria com quem trabalhou no passado e que o considera um mentor, achou que estava na altura de preservar o nome do mestre germânico (que entretanto vendeu a Chronoswiss, em 2011); fundou então a marca Lang 1943, que fará tiragens limitadas com movimentos históricos do espólio de Gerd-Rüdiger Lang. E o acervo é composto por milhares de calibres automáticos e de corda manual, a par de uma das maiores coleções de cronógrafos existente (cerda de 850 exemplares de todas as eras).

Gerd-Rüdiger Lang escreveu mesmo um dos primeiros grandes livros sobre o cronógrafo. Seria de esperar que o primeiro exemplar fosse um cronógrafo, a tipologia que mais facilmente se pode associar a Gerd-Rüdiger Lang, ou até mesmo um regulador… mas a escolha do relógio de estreia recaiu sobre um Field Watch que evoca os modelos militares da década de nascimento do mestre alemão.

Devo aqui abrir um parêntesis para escrever na primeira pessoa e explicar o quão importante foi para mim fazer uma deslocação ao sul da Alemanha durante a primeira semana do torneio de Wimbledon, num período tão complicado do ano e com o caos a grassar nos aeroportos europeus. Conheço pessoalmente Gerd-Rüdiger Lang e acompanhei de muito perto a trajetória da Chronoswiss desde a sua fundação, na década de 80; mas sobretudo tive a honra de traduzir para português, no final da década de 90, o seu livro ‘Sinal dos Tempos’ — no qual ele faz a apologia da relojoaria tradicional e exalta aquele que era então o lema da Chronoswiss: o Fascínio da Mecânica. Daí os fundos transparentes nos relógios, para que as pessoas ficassem… fascinadas. Com a nova marca Lang 1943, o fascínio de Gerd-Rüdiger Lang pela mecânica fica perpetuado.
Protagonistas
Mas Gerd-Rüdiger Lang não é o único protagonista da história. Aliás, sendo ele a inspiração, o maior protagonista é mesmo o já mencionado Georg Bartkowiak, que tudo fez para preservar o legado do seu ídolo relojoeiro. Georg Bartkowiak é um designer e tem um longo historial de trabalhos na indústria relojoeira; também colaborou com a Chronoswiss na elaboração das séries especiais Zeitzeichen. E há vários anos que tinha na ideia o estabelecimento da Lang 1943 — teve foi de esperar pelo momento certo e pelos parceiros ideais que o ajudassem a financiar o projeto.

Por altura da pandemia e consequente confinamento, aproveitou o tempo para estabelecer os alicerces da marca e projetar os modelos a lançar. E o anúncio oficial foi mesmo feito em família: para além da sua mulher e bebé recém-nascido, estiveram em Tegernsee Gerd-Rüdiger Lang e a mulher Antonia, o grande colecionador Hamdan Bin Hudaidi, a sua sócia Melika Yazdjerdi e assessores, e um pequeno núcleo de cinco jornalistas conhecidos de longa data.

O Field Watch Edition One de estreia está equipado com um Calibre 700 da Marvin original dos anos 60, proveniente de um alargado lote de movimentos new old stock de Gerd-Rüdiger Lang — que, na Chronoswiss, também tinha produzido algumas edições limitadas baseadas nesse seu acervo histórico de movimentos. E o Calibre 700 da Marvin, com 46 horas de reserva de corda e uma frequência de 21.600 alternâncias/hora (3 Hz), também servirá de base a uma variante com disposição de regulador e até uma evolução modular para cronógrafo.

O trabalho a fazer é significativo: mesmo que haja um enorme espólio de calibres new old stock e bases de calibres (ébauches), é obrigatório reformular tudo, adquirir os componentes complementares mais adequados e dotar os movimentos de todos os requisitos modernos. Muita labuta entre a Alemanha e a Suíça, como acontecia anteriormente na Chronoswiss. A marca tem um dono e um inspirador que são alemães, mas é tudo feito na Suíça sem que haja a pretensão de colocar no mostrador o certificado ‘Swiss Made’ (que hoje em dia e em tantos casos pouco diz sobre o verdadeiro nível de envolvimento helvético).

Os relógios Lang 1943 têm movimentos de manufatura e nenhum componente oriundo da Ásia, como sucede com tantas marcas que ostentam a etiqueta ‘Swiss Made’. O Field Watch Edition One será comercializado abaixo dos 4.000 euros — à volta dos 3.650 — e tem garantia de proveniência. Tem também vários outros trunfos para além do preço relativamente acessível: tiragem restrita, produção superlativa, proporções ideais, design apelativo. O design do remete especificamente para os relógios militares conhecidos por ‘Dirty Dozen’ e que foram comissionados pelo Ministério de Defesa britânico para produzir robustos exemplares para os seus ativos utilizarem nas missões mais complicadas durante a Segunda Guerra Mundial; estiveram envolvidas 12 marcas (Jaeger-LeCoultre, IWC, Omega, Longines, Eterna, Cyma, Lemania, Buren, Timor, Record, Vertex e Grana) e os modelos específicos têm um submostrador de segundos que serviu de inspiração ao Field Watch da Lang 1943 — especialmente o submostrador maior dimensionado nalguns dos doze exemplares.

Os requisitos do caderno de encargos do Ministério de Defesa britânico incluíam um mostrador preto, submostrador às 6 horas com minuteria tipo caminho de ferro, ponteiros e indexes luminescentes, movimentos de precisão (se possível regulados para atingir parâmetros de cronómetro) de corda manual com 15 rubis, vidro plexiglass à prova de choque e caixa resistente a impactos, coroa de fácil manuseamento mesmo com luvas e a melhor estanqueidade possível para a época. A tipologia fez escola e permanece muito atrativa para os aficionados da relojoaria em geral e adeptos de tool watches em particular.

O que o Field Watch Edition One tem de verdadeiramente diferente, e até surpreendente, relativamente aos ‘Dirty Dozen’ é um extraordinário mostrador dégradé cuja tonalidade e efeito gradiente varia consoante a incidência de luz — vai do cinza ao antracite, do bronze ao castanho. O grafismo a branco e a bege acentua o espírito vintage. A opção pelos ponteiros ‘seringa’ também é especialmente feliz. De resto, a caixa em aço de 39 milímetros (mas que se adapta a pulsos mais pequenos devido à sua excelente arquitetura) está dotada do acabamento mate associado às peças militares (os reflexos podiam trair o posicionamento dos soldados). Mas, sobretudo, o Field Watch Edition One tem um charme rétro incontornável… e o enorme simbolismo de prolongar o legado de alguém que deveria ser muito mais considerado na história da relojoaria contemporânea!

Características técnicas
Lang 1943
Field Watch Edition One
Ano de lançamento | 2022

Movimento | Mecânico de corda manual. Calibre L43.1 (baseado no Marvin Calibre 700). 46h de reserva de corda. 21.600 alt/h.
Funções | Horas, minutos e pequenos segundos.
Caixa ø 39 mm | Aço. Vidro de safira côncavo com tratamento antirreflexo em ambos os lados. Fundo em vidro de safira. Estanque até 50 metros.
Bracelete | Pele ou têxtil com forro interno em tecido Alcantara. Sistema de troca fácil. Fivela em aço.
Preço | Sob consulta.
Visite o site oficial da Lang 1943 para mais informações.