O regresso do mestre Emmanuel Bouchet

Numa era em que toda a gente corre atrás do tempo, Emanuel Bouchet optou pelo sentido contrário — as suas notáveis criações relojoeiras respiram devagar e desconstroem o tempo, mas nunca se atrasam. Eis os mais recentes modelos ‘de tempo lento’ lançados pelo mestre franco-suíço.

Emmanuel Bouchet fundou o seu próprio atelier Emmanuel Bouchet Architecture Mécanique e o conceito MaClef (para encomendas exteriores) em 2014, apresentando no final desse ano o primeiro modelo sob a sua assinatura no antigo evento londrino denominado SalonQP. O Complication One impressionou imediatamente pelas suas elegantes curvas e um novo tipo de complicação filosófica — que denotava o objetivo de desconstruir e expandir o conceito de tempo, mantendo-se fiel aos princípios da alta-relojoaria: a precisão e os acabamentos. A coleção atual do mestre suíço, que outrora brilhou no departamento de grandes complicações da Jaeger-LeCoultre e como chefe do laboratório de complicações da Parmigiani (para além de ter trabalhado no Opus 12 da Harry Winston), apresenta modelos filosóficos que desafiam os fundamentos da relojoaria com caraterísticas únicas. Como os minutos decimais ou um escape à tona do mostrador.

Três pessoas em uma reunião analisando documentos sobre uma mesa em ambiente iluminado suavemente.
O mestre Emmanuel Bouchet e a sua equipa de trabalho | Foto: Emmanuel Bouchet

Qualquer relógio com a assinatura Emmanuel Bouchet é confecionado a 100% na Suíça — mais precisamente no seu atelier de Les Bayards, nas montanhas do cantão de Neuchâtel, com a ajuda de fornecedores helvéticos de superlativa qualidade. Tudo é produzido na oficina do mestre franco-suíço, à exceção de alguns componentes fabricados na Suíça por um seleto grupo de parceiros, incluindo a caixa e os discos de safira do mostrador; cada componente requer semanas de trabalho dedicado para ser aperfeiçoado, razão pela qual a produção anual anda à volta de somente 50 relógios destinados a exigentes colecionadores. E Emmanuel Bouchet é agora secundado pela excelente Aurélie Picaud, antiga responsável do departamento relojoeiro da Fabergé (chegou a receber um prémio no Grand Prix d’Horlogerie de Genève) que entretanto passou pela IWC.

Os novos Complication One

A caminho da dúzia de anos de vida do Complication One, Emmanuel Bouchet revitalizou o seu modelo inaugural — um modelo que desafia a noção clássica do escape, da leitura dos minutos e da perceção do tempo. A nova geração do Complication One foi desvelada durante o Geneva Watch Days de 2025, através de quatro variantes novas ou atualizadas com caixas de 44mm: o Complication One Aleph em ouro ou platina, o Complication One Contrast em titânio e, pela primeira vez, o Complication One Fusion com caixa de safira. As caixas de safira, de dureza inferior apenas à do diamante, são extremamente complexas de fabricar e exigem centenas de horas de usinagem e polimento manual — especialmente na reprodução das laterais elegantemente curvas da caixa, caraterísticas dos modelos metálicos.

Relógio de pulso sofisticado com mostrador metálico azul e pulseira de couro azul, usado no pulso de uma pessoa vestindo camisa listrada.
Um dos novos Complication One de Emmanuel Bouchet | Foto: Miguel Seabra/Espiral do Tempo

Ao estrear o Complication One no final de 2014, Emmanule Bouchet desafiou os fundamentos da relojoaria e deixou tanto a crítica como os aficionados a filosofarem. Para que serve um escape? Como devem ser lidos os minutos? Qual é a nossa relação com o tempo? «Quero que as pessoas desacelerem com os meus relógios», disse então Emmanuel Bouchet. E o melhor exemplo dessa abordagem emocional é o escape de transmissão adicional no centro do mostrador do Complication One, bem visível pela frente. Mantendo-se extremamente preciso, o escape de transmissão de Emmanuel Bouchet é 75 vezes mais lento do que o escape suíço normal (que distribui a energia para o balanço e o ponteiro dos segundos deste relógio), proporcionando assim uma única batida a cada 15 segundos. Um tique-taque muito mais lânguido…

Close-up de um relógio de pulso de luxo com mostrador verde translúcido e pulseira de couro verde, exibindo múltiplos submostradores e engrenagens visíveis.
O Complication One Contrast em ouro branco e tons verde claros | Foto: Emmanuel Bouchet

O escape de transmissão do Complication One, que surge proeminente às 6 horas, é lento… mas distribui exemplarmente a quantidade exata de energia necessária para a indicação instantânea do dia e da noite, das horas, dos minutos e dos 10 minutos. 10 minutos porque há um ponteiro específico a indicar os minutos decimais, ao lado do ponteiro único dos minutos no submostrador das três horas. Essa inovação parece complicada, mas acaba por ser simples: o ponteiro decimal às cinco horas e o ponteiro único às nove horas indicam 59 minutos; um minuto depois, o ponteiro decimal retorna a zero de forma retrógrada. As horas são lidas à esquerda do escape central adicional e, às 12 horas, há um submostrador de pequenos segundos excecionalmente grande que é combinado com um indicador dia/noite.

Relógio de pulso mecânico de luxo Emmanuel Bouchet com mostrador preto, múltiplos submostradores e detalhes em azul.
Outra versão do Complication One, em caixa de titânio e com o típico escape às 6 horas | Foto: Emmanuel Bouchet

Emmanuel Bouchet diz que, para ele, a divisão do tempo em cinco níveis diferentes — dia e noite, hora, 10 minutos, minutos e segundos — é a maneira perfeita de simbolizar o presente através do movimento. «No dia a dia, o segundo representa o menor incremento na medição do tempo e a noite/dia é o maior. Combinar esses dois no mesmo submostrador simboliza que até mesmo a maior coisa é composta de pequenas partes, todas igualmente importantes», diz o mestre franco-suíço.

Relógio mecânico de luxo Emmanuel Bouchet com caixa transparente, mostrador esqueleto e detalhes metálicos prateados.
O Complication One Fusion é apresentado numa caixa transparente em vidro de safira | Foto: Emmanuel Bouchet

O Complication One é movido pelo Calibre EB63, um movimento único e completamente integrado (ou seja, sem módulos). Possui dois tambores de corda que garantem 55 horas de autonomia; pode não parecer uma reserva de corda muito elevada para dois tambores, mas o salto das horas, o salto decimal, os minutos normais e a função retrógrada exigem muita energia. E Emmanuel Bouchet garante precisão quase perfeita em todo o ciclo.

Retrato de um homem calvo usando camisa branca e relógio de pulso ao lado de uma imagem detalhada de um mecanismo de relógio de luxo em tom metálico escuro.
Emmanuel Bouchet e o Calibre EB63 de confeção própria | Foto: Emmanuel Bouchet

O uso de diferentes materiais na linha Complication One também se aplica aos submostradores. A versão Aleph possui submostradores transparentes de safira e o Contrast possui submostradores de titânio, enquanto o Fusion, com caixa de safira, apresenta uma combinação de submostradores de safira e titânio. O Complication One é uma expressão de filosofia através da relojoaria mecânica de extrema precisão, oferecendo um novo tipo de complicação filosófica. «Quero que as pessoas desacelerem. A vida é apenas um momento. Uma hora que passa, um dia fugaz, num mundo que se move cada vez mais depressa», diz Emmanuel Bouchet. E, porque o tempo é precioso, o preço do Complication One começa nos 127.000 francos suíços e vai até aos 150.000, consoante as versões.

A estreia do Source

Durante o Geneva Watch Days 2025, Emmanuel Bouchet apresentou uma nova linha denominada Source — onde uma desconstrução singular do tempo ganha vida de forma lúdica através de elementos cravejados de joias que se projetam a partir de um mostrador côncavo adornado com pedras preciosas ou madrepérola. Está disponível em duas versões: Source Aleph e Source Ribbon, ambas dotadas de uma caixa de 39mm e equipadas com o novo movimento automático de duplo microrrotor EB21L, que proporciona um fornecimento de energia amplo e estável.

Relógio de pulso elegante com caixa dourada, mostrador claro e pulseira de couro vermelho, usado no pulso de uma pessoa vestindo camisa listrada azul e branca.
O Source, novo modelo de Emmanuel Bouchet apresentado em setembro | Foto: Miguel Seabra/Espiral do Tempo

No Source Aleph, disponível em ouro ou platina, o mostrador principal exibe horas e minutos, com o submostrador às 6h30 do dia e noite composto por dois discos sobrepostos de 24 horas; um com estrelas e sol, o outro com as cores do dia e da noite. A sua singularidade reside em três pilares pontiagudos de platina polida, cravejados de pedras preciosas. Tal como tudo, desde os eletrões aos planetas, os três pilares cónicos giram a velocidades diferentes: o mais rápido, às 5 horas, move-se a um segundo de velocidade, completando uma revolução em 60 segundos; o seguinte, às 4 horas, demora 24 horas; o  pilar localizado às 3 horas demora 12 horas.

Relógio de pulso de luxo com mostrador preto tridimensional e detalhes em ouro, apresentando ponteiros esculturais, elementos curvilíneos e uma caixa com aro e laterais cravejados de diamantes.
Pormenor do Source numa versão joalheira Ribbon, com o mostrador tridimensional em destaque | Foto: Emmanuel Bouchet

Porquê a colocação de tais elementos cónicos no mostrador? A razão também é filosófica. «Esses pilares triangulares podem ser vistos como picos de montanhas ou pinheiros que crescem nas encostas. Para mim, representam as raízes da medição do tempo, e com esses pilares simbolizei a desconstrução do tempo. Dois deles movem-se tão lentamente que mal se percebe que estão a mexer-se… e, no entanto, movem-se. É nessa lentidão que todas as mudanças e desenvolvimentos importantes acontecem», refere Emmanuel Bouchet.

Relógio de pulso elegante com mostrador em madrepérola, detalhes prateados e verdes, caixa cravejada de pedras e correia em pele verde.
Os três pilares cónicos em evidência no mostrador do Source Aleph | Foto: Emmanuel Bouchet

O movimento de rotor duplo EB21L tem apenas 4,76 milímetros de espessura e resolve um desafio presente na relojoaria desde sempre. Como garantir que a parte do movimento responsável pela medição do tempo permaneça eficiente quando há complicações que consomem muita energia? Essa solução não só resolve um problema, já que a energia fornecida para a cronometragem não é afetada pela complicação, como também possibilitará o desenvolvimento de complicações futuras.

Parte traseira de um relógio de pulso de luxo com caixa dourada e movimento visível, mostrando o rotor parcialmente dourado e um padrão em forma de colmeia sobre a mecânica interna.
O Calibre EB21L de corda automática e duplo rotor que alimenta os novos Source | Foto: Emmanuel Bouchet

Já o Source Ribbon possui apenas dois pilares móveis, que se movem nas velocidades de segundos e de 24 horas. «Ao justapor os segundos, o incremento mais rápido na medição do tempo quotidiano, com o mais longo, o ciclo diurno da noite e do dia, obtém-se uma noção onírica do tempo. Principalmente porque esses incrementos de tempo não são apresentados num mostrador tradicional: estão escondidos nos cones, à vista de todos. O meu objetivo é que as pessoas reflitam sobre o tempo. É positivo que seja o nosso relógio a lembrar-nos de desacelerar», esclarece Emmanuel Bouchet.

Close-up de um relógio de pulso de luxo com mostrador prateado e detalhes em pedras preciosas, pulseira azul e design curvado e sofisticado.
A construção singular da caixa do Source Ribbon | Foto: Emmanuel Bouchet

O Source Ribbon também permite uma profusão de materiais luxuosos. A caixa está igualmente disponível em ouro ou platina; a madrepérola serve de base ao mostrador principal, enquanto os pilares e os mostradores são adornados com safiras, rubis, esmeraldas e diamantes; ao lado dos cones há uma fita fixa cravejada de diamantes. Todo o relógio se transforma numa exibição de belos materiais e técnicas de arte. Um anel giratório de safiras em todas as cores do arco-íris, cravejado com gemas coloridas (ou personalizado segundo a vontade do freguês) circunda o mostrador principal e serve como um lembrete do rotor duplo; esse anel unidirecional só gira apenas no sentido horário, porque, segundo Emmanuel Bouchet, «não há como voltar atrás no tempo». Os preços vão desde os 86.000 francos suíços para o Source Aleph simples até aos 124.000 para o Source Ribbon com a caixa cravejada de pedras preciosas.

Close-up de um relógio de pulso de luxo com mostrador branco, detalhes metálicos prateados e pulseira azul texturizada.
A impressionante configuração de mostrador do Source Aleph | Foto: Emmanuel Bouchet

Tal como sucede com o Complication One, a linha Source encaixa-se perfeitamente no portefólio de complicações únicas de Emmanuel Bouchet — focado em maneiras criativas de exibir diferentes segmentos de tempo. O mestre franco-suíço admite que segmentar o tempo pode não ser óbvio: «Pode ser difícil compreender as minhas complicações, porque aparentemente não adicionam muitas funções por si só. São mais uma forma própria de expressar uma filosofia», diz. O resultado é seguramente interessante — e atraente. E em 2026 será desvelada uma nova linha, denominada Contemplation e cujo nome por si só deixa antever mais uma interessante maneira de explanar o tempo.

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