Depois da reportagem ao Museu Speelklok, partilho a segunda parte das minhas viagens pelo tempo nos Países Baixos – desta vez, uma passagem pela exposição «Once Upon a Time», em Amesterdão.
Enquanto procurava abrigo do frio de Amesterdão durante uma viagem de fim de ano, cruzei-me com uma exposição pop-up intulada «Once Upon a Time» e dedicada a relógios de mesa do século XVIII. Geralmente associo o conceito pop-up à arte contemporânea, a roupa da moda ou a comidas do momento, pelo que fiquei muito curioso com o que me aguardava. Já de bilhete na mão, entrei então na pequena casa no Museumplein, situada entre o Museu Van Gogh e o Rijksmuseum. É lá que, até ao dia 29 de janeiro de 2023, se encontra a referida exposição.
Once Upon a Time
A exposição «Once Upon a Time» compreende a Parnassia Collection, uma coleção única de mais de 1000 relógios em excelente estado de conservação, produzidos em Paris entre 1750 e 1820 e que podem agora ser vistos pela primeira vez. Naquela época, França dominava a relojoaria e a arte do bronze: uma realidade bem demonstrada pelas detalhadas esculturas das caixas e os ornamentados ponteiros e mostradores dos relógios expostos.
As peças produzidas neste período assumiam um papel de destaque nas salas dos seus abastados proprietários (maioritariamente reis e nobreza de França, Espanha, Reino Unido e Rússia) e serviam como demonstração dos seus gostos, viagens e negócios. Na sua maioria, os temas retratados incluíam o colonialismo, os antigos impérios, o Egito e a mitologia (Grega e Romana).
A maior sala da exposição é dedicada aos controversos relógios Pendule au Noir, pêndulos de mesa que refletiam o fascínio pelo continente africano, numa época em que o comércio de escravos no Atlântico era uma importante fonte de riqueza para a nobreza europeia. Estes relógios adornados com figuras negras personificavam a visão europeia sobre África naquele século e podem dividir-se em três categorias: o Noir Personnifié, em que a figura representa o estereótipo associado ao continente (África ou América); o Bon Noir, em que a figura negra representada vive numa ideia de paraíso, ainda não pervertido pelo conquistador branco; e o Noir Enchaîné, representando o escravo a trabalhar.
A sala do primeiro piso segue o tema anterior e é totalmente dedicada ao relógio Princesa Africana, também conhecido como «Diana Negra». Neste imponente busto imaginado como uma representação de África, a deusa da caça mostra as horas e minutos nos seus olhos sempre que se puxa o seu brinco direito. O brinco da esquerda aciona a caixa de música escondida na sua base, que tocava sete árias com os seus 14 sinos e 25 martelos. Um relógio idêntico foi oferecido à Rainha Maria Antonieta e atualmente só são conhecidos cinco exemplares no mundo.
Entre os relógios da última sala, gostei particularmente dos modelos que pareciam esconder o tempo através de discos em vez de ponteiros e véus delicadamente esculpidos que ocultavam parcialmente o mostrador. Podemos fazer várias interpretações desta ocultação: por um lado, o convívio social deve ser feito sem pressas e pode parecer rude querer saber as horas em casa de quem nos recebe; por outro, talvez estas peças sirvam como espelho das vontades e medos dos seus donos, que tentam ignorar a passagem do tempo com receio de envelhecer. Uma coisa é certa, nesta exposição tão fascinante também não dei conta do tempo a passar!
A exposição «Once Upon a Time» está aberta ao público no Museumplein até ao dia 29 de janeiro e o catálogo completo das peças pode ser adquirido na loja do museu ou encomendado através do email info@once-upon-a-time.amsterdam.