Nicholas Gatehouse

Considerado um dos maiores colecionadores mundiais de relógios Heuer, o britânico Nicholas Gatehouse escolheu Cascais para viver depois de duas décadas em Hong Kong. Para a edição 79 da Espiral do Tempo, aceitou responder a algumas perguntas sobre esta sua relação com os instrumentos do tempo. Hoje publicamos a versão completa da entrevista que publicámos parcialmente na edição impressa.

Por Cesarina Sousa e Miguel Seabra

Considerado um dos maiores colecionadores mundiais de relógios Heuer, o britânico Nicholas Gatehouse escolheu Cascais para viver depois de duas décadas em Hong Kong. É também colecionador de viaturas de época, participando regularmente em concursos internacionais. A paixão pelos Heuer veio do pai e não tem parado de crescer desde que recebeu o primeiro cronógrafo, aos 13 anos. Cresceu a ver o logótipo Heuer na época dourada da Formula 1, na década de 70. Para ele, o ideal é a combinação entre os dois mundos — daí não causar admiração a preferência por cronógrafos clássicos associados ao desporto motorizado.

Nicholas Gatehouse
Nicholas Gatehouse | © Paulo Pires / Espiral do Tempo

Amor para a vida toda

O primeiro amor não se esquece (diz quem sabe): como começou o seu percurso enquanto colecionador?
Esta é uma pergunta à qual é fácil responder: o meu primeiro verdadeiro relógio mecânico foi-me oferecido pelo meu pai por ocasião do meu 13.º aniversário. Foi um Heuer Daytona. Usei-o quase exclusivamente ao longo da década seguinte. Depois entrei para o mundo financeiro e, claro, comprei um Rolex Submariner! Mas separei-me há muito do Rolex e continuo a ter esse primeiro Heuer Daytona.

Heuer Autavia Ref.2446 ‘Rindt’
O Autavia Ref. 2446, apelidado de ‘Rindt’, foi usado pelo malogrado piloto de Fórmula 1 Jochen Rindt – o primeiro piloto de Fórmula 1 a ficar associado a um relógio específico | © Paulo Pires / Espiral do Tempo

O que o motiva a colecionar relógios?
Gosto da caça, da busca e de tentar encontrar exemplares excecionais e raros — que não têm necessariamente de ser exemplares caros. Simplesmente é muito divertido, senão mesmo mais divertido, encontrar um relógio que vale centenas de euros do que um que vale dezenas de milhar de euros. Mas gosto particularmente de encontrar um relógio com história e depois acrescentar-lhe a minha própria história, antes de o passar aos meus filhos.

Em que momento se apercebeu que estava ‘irremediavelmente perdido’ por este mundo?
Isso terá provavelmente acontecido numa determinada altura em que, sentado no escritório, me apercebi de que passava mais tempo a procurar relógios do que a fazer propriamente o meu trabalho. Tinha começado a colecionar relógios alguns anos antes, sobretudo quando via algo de novo de que verdadeiramente gostava, mas só alguns anos depois é que me apercebi de que o meu gosto começava a ir mais na direção das peças clássicas e dos relógios vintage — que são obviamente mais difíceis de comprar a um bom preço e requerem muito mais conhecimento e pesquisa. A minha biblioteca de livros ligados à relojoaria cresceu então de um punhado de brochuras para muitas estantes de títulos de referência e catálogos de leilões, naquela fase antes de toda a informação se tornar acessível através da Internet.

Passado e presente em Le Mans: o Monaco ‘McQueen’ original e o Monaco exemplar único concebido para o leilão de beneficência Only Watch 2021 | © Nicholas Gatehouse / Espiral do Tempo

O que o motiva a colecionar relógios?
Gosto da procura, da busca — e de tentar encontrar exemplares excecionais e raros. Que não têm necessariamente de ser caros; simplesmente é muito divertido, senão mesmo mais divertido, encontrar um relógio que vale centenas de euros do que um que vale dezenas de milhar de euros. Mas gosto particularmente de encontrar um relógio com história e depois acrescentar-lhe a minha própria história, antes de o passar aos meus filhos.

George Ciz, Chief Marketing Officer da TAG Heuer, numa selfie com Nicholas Gatehouse, durante as 24 horas de Le Mans | © George Ciz / Espiral do Tempo

Como descreve a sua coleção?
As minhas duas paixões são os carros e os relógios, por isso a minha coleção está centrada em cronógrafos e relógios associados ao desporto automóvel ou a viaturas clássicas. Há um pendor claro por cronógrafos Heuer, antes de a marca se tornar TAG Heuer, porque foi nessa altura que o meu interesse começou. Cresci a ver a Fórmula 1 nos anos 70 e nesses tempos praticamente todos os carros tinham o logótipo Heuer e quase os pilotos ostentavam um emblema cosido no fato que dizia «Chronograph Heuer».

Confissões de um colecionador


Coleciona relógios para usar ou para os deixar bem guardados na gaveta?
Eu uso sempre os meus relógios, mesmo os new old stock que estão em condição praticamente perfeita — mas uso alguns com mais cuidado do que outros. Atualmente creio que posso dizer que nenhum dos meus relógios new old stock comprado em perfeitas condições ainda se pode considerar new old stock… porque todos foram bem usados! Mesmo que se tenha o maior cuidado do mundo, é quase impossível que o uso não implique ficarem com mais alguns riscos ou marcas nas caixas e braceletes. A minha maneira preferida de riscar um relógio parece ser bater com eles nas fivelas dos cintos de segurança dos aviões! Mas portas giratórias e as arestas das mesas de vidro também podem ser fatais…

O Ref. 750-501 de acabamento PVD, também conhecido por ‘No-Name Pasadena’ | © Nicholas Gatehouse / Espiral do Tempo

Quanto tempo aguenta sem adquirir um relógio?
Sou muito disciplinado e posso esperar muito tempo para fazer uma nova aquisição… a não ser que veja algo que é simultaneamente raro e a um bom preço. Eu costumava comprar com maior frequência, mas de repente vi-me com muitos relógios que não estavam nas condições perfeitas que desejava ou dos quais me cansava rapidamente.

Se voltasse atrás no tempo, quais os erros que não voltaria a cometer enquanto colecionador?
Tinha por hábito comprar logo o primeiro exemplar de um relógio que procurava e muitas vezes me arrependi ao ver depois uma versão melhor no mercado; é sempre preferível esperar que apareça o relógio certo. Também costumava comprar reedições contemporâneas de relógios vintage e depois acabava invariavelmente por preferir o original. Mas devo dizer que também compro relógios novos e gosto do design de algumas pequenas marcas independentes, que não sejam somente versões atualizadas e muitas vezes maiores de antigos designs.

Nicholas Gatehouse
Nicholas Gatehouse | © Paulo Pires / Espiral do Tempo

Tem na sua coleção algum relógio que o faça sorrir pela história que guarda?
O meu pai usou um Heuer Autavia GMT durante quase toda a sua vida, por isso é o relógio que pessoalmente me traz mais recordações… Mas também outros que comprei para celebrar eventos específicos ou quando me sinto especialmente sortudo por ter conseguido encontrá-los. É frequentemente o que acontece com os meus carros: a importância reside menos sobre o carro em si, mas mais sobre as circunstâncias que rodearam a sua compra ou o evento e local que lhe estão associados que me fazem recordar e sorrir.

Sobre futuros possíveis e impossíveis

Qual o seu grail watch?
É difícil definir um grail watch porque gosto de muitas marcas e de muitos modelos — e as preferências estão sempre a mudar, mas agora mesmo gostaria muito de ter um Rolex Daytona Ref. 6264 ‘John Player Special’.

Neste momento, que destino imagina para a sua coleção?
Espero poder deixar a minha coleção aos meus filhos.

Outro ícone entre muitos na história da TAG Heuer: o Heuer Autavia ‘Rindt’ no pulso | © Nicholas Gatehouse / Espiral do Tempo

Que pergunta faria a alguém que está agora a ficar ‘irremediavelmente perdido’ pelo mundo dos relógios?
Eu perguntaria: «porque está a colecionar relógios?» Acho que é melhor ter uma ideia clara logo no início para não começar a comprar os relógios errados. Há um ditado que vale sempre a pena recordar: «Quem à pressa compra, com vagar se arrepende.»

Relógios e bólides, uma associação com afinidade histórica | © Nicholas Gatehouse / Espiral do Tempo

Autorretrato

Identifica-se com algum ou alguns dos estilos de colecionador que tentámos isolar [no artigo ‘Eu e os Outros’ publicado no número 79 da Espiral do Tempo]?
Não tendo tido a oportunidade de ler o texto mencionado, considero que sou um amador entusiasta (ainda com muito para aprender)!

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