Edição impressa | Diário de bordo do Capitão. Coeficiente espaço-tempo 2010/2015. Uma armada de naves extraterrestres deflagra sobre o planeta Relojoaria. Análise de uma tendência intergaláctica.
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Por David Chokron
Crónica originalmente publicada no número 49 da Espiral do Tempo.
Nos confins da nossa galáxia relojoeira, uma flotilha de naves espaciotemporais atravessa o espaço imaginário do relógio interestelar. Inspiradas pela ficção científica, pela conquista do universo infinito e por uma boa dose de segundo grau, algumas marcas transgridem as regras do design tradicional e injetam ingredientes tais como hiperespaço, Star Trek, Goldorak e outras guerras das estrelas. Este estilo, metáfora espacial quase literal, adota formatos dignos de um filme de extraterrestres de Hollywood, na fronteira entre objeto de curiosidade e instrumento do tempo. É apanágio de relojoeiros e designers entre os 30 e os 40 anos, de espírito geek, brincalhão e sonhador. Os seus relógios são cheios de humor e de citações. Mas, para serem pertinentes e passarem além da mera anedota, devem ser compostos pelo mesmo cocktail que todos os outros. O fundo deve ir ao encontro da forma. A mecânica, embora não seja à base de protões, deve servir o propósito estético.
Espacial
Os programas espaciais são a principal fonte de inspiração desta loucura das estrelas. Claro que pensamos no Moonwatch Omega Speedmaster Professional, mas este retém apenas o lado histórico e não o lado metafórico. Por outro lado, o Gagarin Tourbillon da BLU presta homenagem ao primeiro homem que orbitou a Terra.
Montado sobre uma ponte curva 3D de arquitetura pós-revolucionária, o seu turbilhão dá uma volta anti-horária no mostrador em 108 minutos, o tempo que o comandante Yuri Gagarin e a sua cápsula Vostok passaram no espaço a 12 de abril de 1961. Num espírito similar, embora menos literal, Konstantin Chaykin inspira-se nas missões lunares soviéticas. O seu Lunokhod gira em torno de uma lua tridimensional, feita em aço de damasco. Este lunocentrismo é permitido por um movimento inteiramente manufaturado pelo relojoeiro russo. O seu atelier moscovita produziu este modelo que possui um toque funcionalista e severo, próprio das autênticas naves espaciais.
Orbital
Quanto mais o criador se deixa levar pelo seu imaginário, menos transparece o funcionalismo para dar lugar aos delírios mais loucos, ou mais doces. Assim, Vianney Halter imaginou uma estação espacial que evoca a série de televisão Star Trek Deep Space 9. O Deep Space é um turbilhão triaxial. Os seus ponteiros, longas lanças curvas azuis, orbitam na periferia daquilo a que poderemos quase chamar mostrador. A sua rotação sobre os três planos refere-se à ausência de marcadores no espaço, onde a gravidade está ausente, tanto no sentido literal como figurado. Romain Jerome imaginou, igualmente, a sua própria versão de uma nave espacial. Inspirado pela estrela da noite desde os seus primeiros Moon Dust, nos quais o mostrador guarda poeiras verdadeiras das missões de exploração lunares, a marca não parou por aí. Lançou um modelo com turbilhão no qual a caixa tem um módulo de pouso lunar. As asas do Moon Orbiter são montadas em cilindros, e os vidros laterais parecem ser feitos para a observação desde o exterior e interior.
Interestelar
Nas suas versões mais afiadas, a nave espacial é uma lâmina que perfura o vazio interestelar. A ideia de se aproximar da velocidade da luz retorna aos perfis pontiagudos, como o Dream Watch 5 da De Bethune. Munido de uma lua cinza e azul, que é a assinatura da marca, horas saltantes e minutos sobre disco que são a especificidade deste modelo, apresenta uma caixa de perfil acentuado que faz lembrar algumas naves de Star Wars.
Imaginário
Mas quando se trata de ficção científica, de banda desenhada e de universos infantis, a MB&F é, de longe, a marca mais envolvida. O seu criador, Max Büsser, reivindica orgulhosamente as suas inspirações dos anos 70 e 80: Goldorak e Star Wars. Este último filme ofereceu a sua melodia à MusicMachine que a marca desenvolveu com a Reuge. Caixa de música em forma de nave espacial, co-habita com a estação orbital Starfleet, relógio monumental coproduzido com a L’Epée (imagem de destaque neste artigo). O último delírio interestelar até à data, a sua HM6 foi buscar inspiração e o nome ao Capitão Flam, o Pirata do Espaço. O seu turbilhão volante destaca-se no centro da cabine em titânio, fechada, e que se revela ao olhar através de uma escotilha esférica que faz lembrar uma torre de observação. O relógio conta com mais quatro escotilhas, duas para as horas e os minutos, e outras duas para mostrar as turbinas que regulam a intensidade da corda automática. Fora da caixa, o movimento faz lembrar um rover lunar. A metáfora está concluída, o circuito está fechado, o objeto é extraterrestre no seu exterior e no seu coração.
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