Baselworld 2019: os tempos estão a mudar

Os tempos estão a mudar. Era o que cantava Bob Dylan no início da década de 1960. E também estão a mudar na indústria relojoeira. A Baselworld começa esta semana – já amanhã dia 21 de março, prolongando-se até dia 26. Numa época em que um conjunto de tradições e hábitos começam a ser postos em causa pelas novas tendências de distribuição comercial e de relação com clientes. Este será um ano de transição, onde será apresentado um novo conceito. A verdadeira revolução é esperada em 2020.

Durante décadas a Baselworld foi a mais importante feira da indústria relojoeira. Mas a transição para novos modelos de negócio, de produção e de marketing, está a modificar o papel das feiras. Face a isso a nova equipa da Baselworld tentou já modernizar o evento. Tal como alterou a relação com os clientes e com o público. Será isso suficiente?

Não há muito tempo a diretora do SIHH (o salão de Genebra, muito ligado ao grupo Richemont) dizia: «É preciso inventar o salão futuro.» Isso aconteceu em Basileia, num contexto de saída de algumas empresas, no seguimento do anúncio por Nick Hayek, o patrão do maior grupo mundial de relojoaria, o Swatch Group (que junta ainda marcas como Omega, Tissot, Longines ou Jaquet Droz), numa entrevista ao NZZ am Sonntag: «As feiras de relógios tradicionais já não fazem sentido para a Swatch.» Em 2019, o grupo Swatch já não está presente na Baselworld. Outras saídas foram entretanto anunciadas: a da Audemars Piguet e da Richard Mille do SIHH em 2020. E da Baselwold foram anunciando a saída a Dior, a Hermès, a MGI/Ebel, e outros.

A partir de 2020 a SIHH e a Baselworld sincronizarão o seu calendário.
A partir de 2020 a SIHH e a Baselworld sincronizarão o seu calendário.

Até que ponto isso inspirará outros, como a LVMH, a Rolex e a Patek Philippe, a deixarem a feira de Basileia? Estaremos a assistir à debandada geral das feiras? A evolução da feira é uma solução, depois da crise de 2017, do desaparecimento de revendedores e do desinteresse crescente das grandes marcas por salões de grande dimensão. Fazer feiras mais pequenas é uma solução. Ter mais visitantes do grande público, em vez de ser só algo profissional, é outra via. Será suficiente? Michel-Loris Melokoff, um antigo banqueiro, estava no seu novo emprego, managing director da Baselworld, há poucas semanas quando a Swatch anunciou a sua decisão. Foi um choque. As feiras procuraram respostas: uma delas foi uma junção quase inédita de ideias: a partir de 2020 a SIHH e a Baselworld sincronizarão o seu calendário. O SIHH terá lugar entre 26 e 29 de Abril e a Baselworld entre 30 de Abril e 5 de Maio. Será uma resposta certa? O tempo o dirá.

Neste contexto o banco Morgan Stanley divulgou há poucos dias o seu relatório anual sobre a indústria relojoeira. Para já o banco constata uma polarização entre as marcas suíças. Segundo ele sete marcas ultrapassaram os mil milhões de francos suíços de volume de negócios em 2018. A liderar surge a Rolex com vendas estimadas de 5,4 mil milhões de francos, seguida da Omega (grupo Swatch) com 2,34 mil milhões de francos e da Longines (grupo Swatch) com 1,65 mil milhões. Nas posições seguintes surgem Cartier, Patek Philippe, Tissot e Audemars Piguet. O Morgan Stanley fala de «polarização» da indústria: dá o exemplo do grupo Swatch onde o forte crescimento da Omega e da Longines (que geraram 70% dos lucros operacionais) contrastou com o desempenho igual ou inferior face a 2017 das outras marcas. Ou seja, os próprios grupos vão ter de começar a olhar para as suas marcas. E, com isso, vem a estratégia face a eventos caros, como a presença em feiras.
É neste contexto de mutação do negócio que os organizadores da Baselworld reconhecem o estado de declínio do universo das feiras. A queda do número de exibidores tem sido uma constante nos últimos anos. A saída do grupo Swatch (com as 18 marcas que detém) foi um rude golpe no certame. Até porque consta que a sua presença ali custava cerca de 50 milhões de francos suíços. O futuro passa pela modernização, face a um mercado irregular e à força do SIHH.

Baselworld 2016 @ Baselworld
Baselworld 2016 @ Baselworld

Mas a Baselworld não deixa de ser uma instituição. Continua a haver a vantagem de ver a maioria dos lançamentos do ano num único local, mas isso não chega. Os ‘Big Five’ são agora os ‘Fab Four’ em Basileia: saiu o grupo Swatch, mas mantêm-se a Rolex, a LVMH (TAG, Bulgari, Hublot, Zenith), a Chopard e a Patek Philippe. Mas o futuro está na forma como a sociedade que gere a Baselword, a MCH, vai gerir o evento a partir de agora.

A Baselworld não é um incidente isolado. Ganhar os jovens e os clientes com menos poder económico são cruciais para que a indústria não caia na obscuridade. O SIHH percebeu, antes dos gestores da Baselworld, a evolução do negócio, as novas fórmulas de consumo e a digitalização. Só que hoje tudo muda mais rapidamente. Há seis anos, quando o mercado chinês estava no auge, a Baselworld estava saudável. Era uma das duas jóias da MCH (a outra era a Art Basel), a empresa que gere 20 feiras na Suíça. A reconstrução do Hall 1 exemplificava isso. Agora luta pela sobrevivência: em três anos cerca de 1000 exibidores deixaram a feira. Os visitantes contraíram. Os lucros da MCH caíram. Tudo começou com a queda das receitas que, da Ásia, chegavam às marcas. Estas decidiram cortar custos. Estar na Baselworld também passou a ser mais caro e assim passou a ser difícil um equilíbrio para muitas marcas. O digital fez o resto: muitos questionaram-se sobre a razão de gastar muito dinheiro para estar em Basileia. Há 20 anos 70% das receitas de muitas marcas eram feitas ali. Isso é passado. Agora o seu destino está nas mãos da Rolex e da Patek Philippe, depois da saída do grupo Swatch. Isto apesar de Jean-Claude Biver já ter dito: «ninguém quer ser recordado como a marca que matou a Baselworld.»

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