Raymond Weil: dinastia musical

A Raymond Weil é uma das poucas companhias relojoeiras de certa dimensão que permanece independente e na mão da família fundadora — e é sobretudo aquela que mais intrinsecamente surge ligada ao universo musical. Desde o próprio Raymond Weil ao neto Elie Bernheim, a música tem sido um fio condutor na estratégia da marca e essa associação melómana afigura-se atualmente mais forte do que nunca.

Artigo originalmente publicado no número 53 da Espiral do Tempo (inverno 2015)

Quando se entra na casa da família Weil-Bernheim em Cologny, uma privilegiada e elegante zona residencial de Genebra, é impossível não deparar com os dois pianos da lendária Steinway & Sons no meio da sala. De certo modo, constituem um poderoso símbolo da estreita ligação da Raymond Weil à música e fazem a ponte entre as três gerações que têm conduzido a marca fundada por alguém que resolveu combater a crise que na altura vitimava dúzias de empresas relojoeiras suíças e atirava milhares para o desemprego. Os pianos pertencem a Diana, pianista profissional — filha de Raymond Weil, mulher de Olivier Bernheim e mãe de Elie, Pierre e Noemia Bernheim.

Raymond Weil, fundador da marca, com Olivier, Pierre e Elie Bernheim, este último o atual CEO | Foto: Raymond Weil

Raymond Weil, um gentleman muito respeitado e de quem era impossível não se gostar, morreu a 26 de janeiro de 2014, aos 87 anos. Quando decidiu criar a sua própria marca, em 1976, já trabalhava no ramo há 27 anos e ousou colocar o seu próprio nome no mostrador (uma prática que na altura era considerada um sacrilégio) para se orgulhar do Swiss Made face à avalanche de relógios de quartzo provenientes do Oriente. Apresentou a primeira coleção numa mesa desdobrável na edição de 1977 da feira de Basileia e vendeu 5.000 exemplares nesse primeiro ano; no ano seguinte, o número passou para os 40.000, e, em 1982, já ascendia aos 70.000. A par do sucesso inicial, duas notas merecem relevo: numa perspetiva lusa, Portugal foi dos primeiros países a abraçar mais convictamente a nova marca; num plano estratégico, cedo foi decidido desenvolver a imagem da marca à volta da música clássica.

O Raymond Weil Nabucco inspired by Gibson foi o relógio de capa do número 53 da Espiral do Tempo (inverno 2015) | Foto: Paulo Pires/ Espiral do Tempo

Olivier Bernheim, cunhado do fundador, começou a trabalhar na Raymond Weil em 1982 e assumiu o cargo de CEO desde 1996, até que, no dealbar da presente década, começou a preparar os filhos Elie e Pierre para a sucessão. Elie assumiu as rédeas da companhia no início de 2014 e Pierre desenvolve outra marca no seio familiar (a 88 Rue du Rhône); só Noemia não está diretamente ligada à relojoaria, mas pelo menos já deu o seu nome a uma das coleções.

Nomenclatura musical

Atualmente com mais de 3.500 pontos de venda em todo o mundo e uma produção anual de cerca de 200 mil exemplares, a Raymond Weil apresenta-se como uma sólida companhia face à difícil conjuntura económica atual e mantém-se orgulhosamente independente perante os grupos e aglomerados que caraterizam o tecido da indústria relojoeira suíça. O nome da linha Freelancer evoca essa independência e Noemia é a outra nomenclatura que, nos catálogos dos últimos anos, não está etimologicamente relacionada com o universo musical — de resto, a tradição mantém-se inabalável, com a designação de coleções como a Nabucco (batizada em homenagem a Giuseppe Verdi), Maestro, Tango ou Toccata. O historial da Raymond Weil inclui ainda nomes como Parsifal, Don Giovanni, Amadeus, Fidelio, Tosca, Allegro, Traviata, Adagio e Othello, que não deixam dúvidas quanto à inspiração melómana.

Nabucco Cello Tourbillon | Foto: Raymond Weil

O vínculo surge atualmente ainda mais reforçado sob a liderança de Elie Bernheim, que tem aberto novos campos musicais para a marca. «A Raymond Weil está envolvida com a música desde a sua génese. A música foi fonte de inspiração no passado e hoje torna-se o veículo de valores que desejamos para a marca», sublinha o jovem CEO, que tem potenciado um plano de atividades e parcerias iniciado há já três décadas: a ligação ao inesquecível filme Amadeus, de 1984, é um marco incontornável na história da marca e catapultou as vendas da linha Amadeus na altura; já em 1986 era criada a denominada Bolsa RW para apoiar jovens músicos na apresentação pública do seu trabalho. 

Raymond Weil Naucco Gibson
Raymond Weil Nabucco inspired by Gibson | Foto: Paulo Pires/ Espiral do Tempo

A abrangência musical foi-se alargando ao longo do tempo, sobretudo desde que foi assumida uma mediática parceria com os Brit Awards a partir de 2008, sendo que a Raymond Weil lança anualmente uma edição limitada dedicada ao certame e atribuída aos artistas nomeados e galardoados. Em 2010 e 2011, houve mesmo uma parceria com o popular concurso televisivo American Idol e, em 2011, organizou uma competição nomeada New Music Talent, que consistia em desafiar músicos amadores a criarem um tema inspirado pela marca, e divulgou os seus trabalhos através das redes sociais. A Raymond Weil tornou-se depois official timing partner do vetusto Royal Albert Hall, em 2013, ano em que também iniciou uma parceria com a Wired — uma plataforma de música ao vivo que apoia jovens músicos emergentes. Relevante é também a ligação à VH1 Save the Music Foundation, que trabalha para restaurar a educação musical nas escolas públicas americanas. Para além destas, houve também várias outras iniciativas locais ou pontuais consoante as circunstâncias e os mercados.

Pautas mais modernas

Da esquerda para a direita: Freelancer BRIT Awards 2015, Nabucco Cello Tourbillon e Maestro Franck Sinatra Limited Edition | Fotos: Raymond Weil
Da esquerda para a direita: Freelancer BRIT Awards 2015, Nabucco Cello Tourbillon e Maestro Franck Sinatra Limited Edition | Fotos: Raymond Weil

Paralelamente a todas essas iniciativas e esses eventos, Elie Bernheim nomeou embaixadores os dois virtuosos violoncelistas Luka Šulić e Stjepan Hauser (um croata e um esloveno) que atuam sob o nome de 2Cellos, e estabeleceu uma parceria com a lendária manufatura americana de guitarras Gibson. Além disso, criou uma edição especial destinada a homenagear o eterno Frank Sinatra que conheceu enorme sucesso e nomeou a famosa violinista clássica Nicola Benedetti nova imagem da marca. 

«O meu avô sempre estabeleceu o mundo musical como seu território preferencial de comunicação. A música era a paixão do meu avô e a associação melómana sempre lhe pareceu legítima. Eu tenho procurado outros horizontes para além da música clássica, que sempre foi muito importante para nós, mas também é salutar abraçarmos outro tipo de música mais contemporânea, moderna, jovem. Por exemplo, contactei com os 2Cellos porque eles representavam uma visão moderna da música clássica».

Raymond Weil Nabucco inspired by Gibson | Foto: Paulo Pires/ Espiral do Tempo

E depois há a parceria estabelecida com uma marca emblemática no mundo do rock: «A associação à Gibson é-me muito cara, trata-se de uma companhia familiar com uma visão empresarial idêntica à nossa e que partilha os nossos valores. Fui a Nashville descobrir a fábrica deles e acabou por ser um dos momentos mais extraordinários da minha vida — na produção das guitarras, vê-se um savoir-faire e uma precisão com os quais me identifico, para além dos valores familiares evidentes. E, na sequência da parceria, sentimos que houve aficionados da marca a estabelecerem contacto com os nossos distribuidores em todo o mundo; trata-se de uma bela associação que é uma honra para nós», destaca Elie Bernheim.

O atual ‘regista’ da Raymond Weil tem uma formação clássica, mas não descura o pop e o rock: «A nossa família é melómana de A a Z. Comecei a tocar piano aos três anos e estudei violoncelo; a música está enraizada no meu sangue e no nosso ADN, mas não queríamos estar somente no universo do clássico». Praticamente todas as maiores vedetas da música moderna nos últimos anos receberam o seu relógio nos Brit Awards. Ano após ano, vão-se abrindo novas portas e a ligação torna-se cada vez mais relevante. Para o ano, vão ficar todos siderados com o que iremos anunciar!», revela, acrescentando que as suas preferências musicais no âmbito do pop-rock vão para os U2, Coldplay, Killers e também para «os Beatles, que amo profundamente e com os quais cresci», sem se esquecer de referenciar clássicos como Tchaikovsky ou Mendelssohn.

Música portuguesa, com certeza

A edição limitada Raymond Weil Parsifal ‘Carlos Paredes’ | Foto: Espiral do Tempo

A arte musical nas suas mais variadas manifestações faz parte do código genético da Raymond Weil e também inspirou várias edições comemorativas criadas em Portugal. Em 2004, foi apresentada uma série limitada derivada da linha retangular Don Giovanni, que celebrou então os 100 anos do fado; um ano depois, a homenagem que assinalou o 80.º aniversário do célebre guitarrista Carlos Paredes, através do lançamento de um relógio da linha Parsifal. Seguidamente, o tributo a um dos maiores intérpretes portugueses de sempre:  o ‘Don Giovanni Carlos do Carmo’ foi declinado numa versão em ouro rosa dotada de um belíssimo mostrador com dois fusos horários e um fundo que, além de deixar entrever o mecanismo automático, continha a gravação dos dois primeiros acordes do tema «Estranha Forma de Vida», o primeiro fado gravado por Carlos do Carmo. A fadista Carminho, representante de uma nova maneira de cantar o fado, é embaixadora da marca.

Internacionalmente, a Raymond Weil lançou este ano o seu relógio mais complexo de sempre — sempre sob a batuta musical: o Nabucco Cello Tourbillon inclui a primeira grande complicação da marca num mostrador esqueletizado que evoca claramente os elementos estilísticos de um violoncelo. O poderoso cronógrafo Nabucco associado à Gibson inspira-se nas seis cordas da guitarra SG Standard (best-seller da marca, a par da Les Paul), enquanto o Maestro Frank Sinatra Limited Edition é uma criação mais elegante e intemporal.

Mas haverá mais novidades em breve. Até o espaço da Raymond Weil na maior feira mundial da indústria relojoeira — Baselworld — evoca um enorme violoncelo de madeira e será lá que, no cumprimento do 40.º aniversário, será feita uma revelação muito especial. «Vão ficar todos siderados com o que iremos anunciar», promete Elie Bernheim. Para a Raymond Weil, comunicar ao som da música sempre surtiu o melhor efeito e tudo indica que a marca genebrina vai continuar a dar-nos música durante muito mais tempo…

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