Niki Lauda deixou-nos, aos 70 anos. Nascido em Viena, em 1949, o lendário ex-piloto foi tricampeão mundial de Fórmula 1 e era atualmente diretor não executivo da Mercedes. Os mais atentos poderão ter reparado que a TAG Heuer já fez questão de prestar a sua homenagem ao piloto austríaco, através de imagens que o retratam junto a protagonistas e elementos históricos da ligação da marca suíça à competição automóvel.
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Niki Lauda morreu ontem, dia 20 de maio, aos 70 anos — na sequência de complicações associadas a um transplante pulmonar. Nascido em Viena, em 1949, o lendário piloto foi tricampeão mundial de Fórmula 1 (o terceiro título até foi alcançado no circuito do Estoril) e hoje em dia era diretor não executivo da Mercedes. Ao longo da sua vida, entre os 177 grandes prémios em que participou, Lauda conseguiu acumular 25 vitórias, 52 pódios e 24 pole positions.
Os mais atentos poderão ter reparado que a TAG Heuer já fez questão de prestar a sua homenagem ao piloto austríaco, através de imagens que o retratam junto a protagonistas e elementos históricos da ligação da marca suíça à competição automóvel. A explicação é simples e obriga a uma viagem no tempo: quando, nos anos 70, a Heuer se tornou cronometrista oficial da Ferrari, Jack Heuer entregou pessoalmente a todos os pilotos associados à Scuderia ao longo desse período um Carrera em ouro com o respetivo nome e grupo sanguíneo gravados no fundo. Entre os pilotos estava Niki Lauda, cujo relógio acabaria por ser roubado.
O descendente do fundador da marca e nome incontornável da sua história chegou a referir esse particular modelo Carrera em ouro como sendo o seu relógio preferido da companhia relojoeira por razões afetivas, já que esteve ligado a esses pilotos que negociavam com a morte a cada curva nesses tempos épicos da Fórmula 1. Afinal, Jack Heuer acabaria por tornar-se amigo pessoal de todos eles — onze pilotos no total.
Rush e a celebração de uma rivalidade
Há uns anos, o filme Rush, sob a direção de Ron Howard e guião de Peter Morgan, retratou a rivalidade entre Niki Lauda e James Hunt no âmbito da inolvidável temporada de 1976 em que ambos lutaram pelo título de campeão mundial de pilotos até à última corrida — destacando naturalmente o violento acidente que acabaria por marcar essa temporada e contribuir também para elevar o austríaco ao estatuto de lenda, devido à coragem mostrada pelo regresso aos circuitos com a cara meio queimada e semanas depois de ter estado à beira da morte.
Por alturas de 2012, a TAG Heuer ouviu rumores de que estaria a ser preparada uma produção cinematográfica tendo por pano de fundo a Formula 1 dos anos 70 e, devido à sua presença como cronometrista oficial da Ferrari e não oficial de outras escuderias da altura, pensou em estabelecer contacto com os responsáveis do filme. Acabou por não foi necessário: a produção tomou a iniciativa em primeiro lugar, à semelhança do que já havia acontecido no filme de 1970 sobre as 24 Horas de Le Mans — no qual Steve McQueen usou um cronógrafo Monaco e o fato de corrida do piloto suíço Jo Siffert que tinha bordado o logótipo da Heuer (que passaria a ser denominada TAG Heuer a partir de 1985).
Foram estabelecidos os contactos necessários e, quando o realizador Ron Howard visitou o Grande Prémio do Mónaco (patrocinado pela TAG Heuer), já estava tudo formalizado. O Museu da TAG Heuer, através da sua então diretora Marie Ansel, disponibilizou uma lista de dez artigos que incluiu quatro cronógrafos mecânicos de mão e seis cronógrafos de pulso – um Carrera em ouro, um Silverstone azul, um Silverstone castanho, um Monaco, um Manhattan e um Chronosplit Ferrari.
Por óbvios motivos históricos, o Carrera em ouro estava pensado para o ator que fazia de Niki Lauda (o alemão Daniel Brühl) e um dos Silverstones para o personagem de James Hunt (interpretado pelo australiano Chris Hemsworth). No entanto, alguém na produção deverá ter achado que o Carrera em ouro tinha mais a ver com a personalidade do playboy britânico e houve uma troca, com o Silverstone a ir parar ao pulso do metódico austríaco.
Na longa metragem estreada em 2013 e que relata o trajeto dos rivais até à respetiva entrada na Fórmula 1, vê-se que, quando Niki Lauda chegou à Ferrari, a Scuderia tinha na altura como piloto o carismático Clay Regazzoni; foi precisamente na presença de Regazzoni, um suíço, que Lauda assinou contrato com Jack Heuer para usar cronógrafos da marca e envergar o respetivo logotipo no macacão. Daí a célebre foto com que abrimos este artigo.
Não é fácil descortinar os dois relógios no filme. Vê-se bem a silhueta inconfundível do Silverstone no pulso de Niki Lauda durante uma conversa com a sua mulher, enquanto só mais para o fim é que se vê melhor James Hunt com o Carrera, quando está prestes a entrar para um avião privado e tem a conversa final com o seu grande adversário das pistas. Curiosamente, James Hunt chegou mesmo a ter posteriormente um Carrera em ouro… ao passo que o de Niki Lauda seria roubado. E não, as duas coisas não estão relacionadas: não foi Hunt a roubar o relógio a Lauda; mesmo que a rivalidade entre ambos fosse enorme, especialmente naquela temporada de 1976, os dois pilotos eram mais amigos do que o filme deixa supor e chegaram mesmo a partilhar um apartamento em Londres numa fase inicial das respetivas carreiras.
Apesar de o Carrera em questão ser o relógio de toda a história da TAG Heuer que se tornou no preferido de Jack Heuer devido a essa sua ligação simbólica a grandes figuras da era dourada da Fórmula 1, não apresenta a arquitetura mais habitual dos Carrera que foi retomada aquando da primeira reedição, em 1996, e que está bem representada no catálogo atual da marca. O Carrera do filme tem as formas do modelo estreado em 1969 e que teve várias variantes de formato cushion ao longo da década de 70 (com formas típicas dessa altura), enquanto os Carreras dos tempos modernos inspiram-se no original redondo de 1963 e nas suas múltiplas declinações (o Carrera Heuer 01 faz parte de outro campeonato, sendo mais modernista).
Quanto ao Silverstone, foi produzido entre 1974 e 1977 em três versões de cores distintas: azul mate, castanha metalizada e vermelha sangue. Segundo Jack Heuer, naquela altura havia muita gente que achava o quadrilátero Monaco demasiado angular e ele teve a ideia de arredondar-lhe os cantos; foi assim que nasceu um dos modelos mais emblemáticos mas incompreendidos na história da marca. Em 2010, e no âmbito das celebrações do seu 150º aniversário, a TAG Heuer lançou duas reedições em tiragem limitada a 1860 exemplares (1860 é o ano da fundação da TAG Heuer) das versões azul mate e castanha metalizada, com fundo transparente e gravação comemorativa. Houve ainda uma única reedição do exemplar vermelho, leiloado para fins de beneficência — no final do primeiro leilão exclusivamente de modelos Heuer, em 2010, pertencentes ao colecionador austríaco Arno Haslinger.
Eis assim algumas das histórias relojoeiras ligadas a Niki Lauda. No entanto, é convidando à (re)leitura de uma entrevista exclusiva a Jack Heuer que prestamos a nossa homenagem ao piloto britânico. Afinal, o pai do cronógrafo desportivo e nome incontornável da história da TAG Heuer, conta na primeira pessoa alguns destes episódios e refere-se a Niki Lauda com elevado respeito e admiração. Estávamos em 2010. Já lá vão uns bons anos.
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