De todos os modelos da Graham o mais icónico é sem dúvida o Chronofighter. Tive em mãos as quatro versões em bronze e, numa sessão fotográfica em estúdio, (re)descobri em detalhe toda a riqueza de construção e acabamentos em 46 mm de pura imponência relojoeira.
—
Fotograficamente o bronze é um material delicado de captar. Dependendo da incidência de luz pode assumir uma tonalidade mais quente ou mais fria. Não há uma tonalidade correta porque todas os são e um relógio não habita ambientes controlados e, como tal, reflete em si nas suas cores e materiais o mundo que o rodeia.
Claro que, em estúdio, existe algum controlo sobre esses elementos e, apesar de o objetivo não serem fotografias técnicas, há que tentar uniformizar a temperatura de cor em prol de uma apresentação visual coesa. Por outro lado, certos mostradores são complexos exibindo variantes cromáticas que não estão apenas relacionadas com a temperatura de cor, mas também com o ângulo de incidência da luz o que pode alterar drasticamente a perceção visual cromática e textural.
No meu método de trabalho, tão válido como qualquer outro, a primeira abordagem pré-fotográfica é verificar se a caixa do relógio é polida, escovada, ou ambas. Depois passo para o mostrador. Se é liso, guilloché, escovado, sablé ou com qualquer outro tipo de acabamento. Estas duas grandes componentes obrigam a diferentes abordagens e, muito frequentemente, os settings para se conseguir uma boa fotografia da caixa não são os mesmos para se conseguir uma boa fotografia do mostrador.
Aparte técnico
Sempre vi com bastante agrado a crescente adesão de apaixonados e colecionadores à captação fotográfica do seus relógios. Tenho como opinião pessoal que isso cumpre o objetivo de nos apaixonarmos cada vez mais pelas peças, de as descobrirmos de um modo mais pessoal e de nos levar a observá-las de um outro modo. Não incluo aqui os chamados wristshots que, quanto a mim, não procuram qualquer visão estética sobre a peça.
Independentemente do equipamento que cada um possua, há fatores técnicos que não variam, como tal, deixo uma sugestão de leitura daquele que considero a bíblia da fotografia: Fotografia Básica de Michael Langford. É um dos meus livros de cabeceira de há 30 anos a esta parte. Sofreu várias atualizações ao longo dos tempos, mantendo sempre uma bitola de seriedade e de componente formativa ímpar.
Primeiro passo
Quando fotografo um relógio faço-o sempre usando o ISO mais baixo possível para garantir o menor ruído digital. Há casos de exceção, verdade, mas é uma boa estratégia, sobretudo quando são trabalhos para clientes ou para a edição impressa da Espiral do Tempo. Imagens para impressão em gráfica têm outra exigência daquelas que apenas têm como objetivo serem partilhadas em redes digitais ou outras plataformas virtuais. Resumindo, a minha primeira ‘âncora’ é o ISO.
O segundo fator é a abertura. Chama-se abertura à abertura (passe a redundância) pela qual a luz irá passar para queimar a imagem no sensor ou na película. A abertura é fundamental em fotografia pois é ela que estabelece a chamada profundidade de campo. Chama-se profundidade de campo à parte da imagem que queremos em foco. Se queremos destacar um elemento do relógio, usam-se aberturas grandes. Se queremos ter a maior área possível dentro do foco usam-se aberturas pequenas.
A profundidade de campo é crucial sobretudo em fotografia macro. Muitas vezes e mesmo usando aberturas pequenas, como se está a fotografar a uma curta distância do relógio, é impossível ter uma peça toda em foco. São limitações de ordem física, ótica e outras e para contornar isso já seria necessário entrar no campo dos equipamentos de médio e grande formato ou usar aparelhos auxiliares que permitam um focus stacking, mas isso já é outro pano para mangas.
Temos então dois fatores cruciais, o ISO e a abertura. Estas duas variantes irão ditar uma outra que é o tempo de exposição. O tempo de exposição é o tempo que o obturador da máquina vai estar aberto para deixar passar a luz. Como regra geral, pode dizer-se que tempos inferiores a 1/60, 1/30 de segundo resultam em fotos tremidas.
Em estúdio fotografo na esmagadora maioria das vezes com tempos de exposição entre 10 e 30 segundos! É então fundamental o uso de tripé. O tripé não só vai garantir a estabilidade da máquina durante exposições longas, mas também permite que se varie a iluminação em cada foto facilitando e muito a posterior montagem na edição digital.
Live view
Quando se trabalha com exposição manual e máquinas reflex usar o live view é fundamental. O live view permite ver em tempo real a exposição, ou seja, permite saber em termos de luz como irá sair a fotografia num display maior do que o simples viewfinder. Permite manusear a iluminação e fazer acertos detalhados no posicionamento e proximidade da(s) fontes de luz.
Com o crescente desenvolvimento de máquinas mirrorless essa tarefa ficou muito simplificada pois este tipo de máquinas, além da visualização da exposição, conseguem também dar a noção da profundidade de campo que referi atrás.
Bronze delight
A caixa dos Graham Chronofighter vintage bronze é um portento. O acabamento escovado permite que os generosos 46 mm acrescidos do trigger do cronógrafo e da coroa às 11 h seja amenizado e se torne discreto no pulso. Para captar o escovado da textura da caixa nada como ativar o live view e, segurando na fonte de luz, ir variando o ângulo de incidência. A incidência direta rouba textura, a incidência rasante pontencia essa textura. Um refletor ajuda a uniformizar a superfície.
Numa peça com estas características acho que é a variação de zonas de luz e zonas de sombra que ajuda a realçar a tridimensionalidade da caixa. Como tal, não me importo, pelo contrário, gosto de acentuar essas sombras. Sempre tive aversão às chamadas ‘tendas fotográficas’, precisamente pela demasiada uniformização e destruição das sombras que torna os relógios demasiado bidimensionais, sem volume.
No entanto, a luz que serve os meus intentos para fotografar a caixa do relógio, pode não ser a mesma que me agrada para provocar sombras, para iluminar o mostrador ou a correia e aqui entra em jogo novamente o uso do tripé. Tendo a máquina apoiada no tripé e socorrendo-me do live view, manuseio manualmente a fonte de luz para me dar um determinado resultado na caixa, por exemplo. Após ter conseguido a foto que pretendo e sem mexer em absolutamente nada, faço exatamente o mesmo até conseguir o resultado que me agrada no mostrador e repito a operação tantas vezes quantas forem necessárias até ter a imagem que pretendo dividida em várias.
Estas imagens são depois combinadas no Photoshop, apagando de cada uma as partes que não quero. Simples!
Este processo é fundamental para peças complexas como é o caso devido às várias texturas de caixa e mostrador e em que a iluminação ideal para determinados elementos não se adequa a outros. Este processo é moroso durante a recolha de imagens e durante a edição e existem maneiras de o tornar mais simples, mas que nem mesmo nós na Espiral do Tempo o conseguimos fazer. Falo por exemplo de fotografar os relógios sem vidro. Esse pequeno detalhe facilitaria em horas e dias o processo fotográfico, pois para além dos reflexos existe o problema do tratamento antirreflexos de cada vidro o que faz com que projete uma dominante cromática sobre o mostrador que pode ir desde o azul, ao magenta ao branco leitoso.
Outro dos aspetos é a colocação dos ponteiros. Tento seguir as regras de cada marca, mas para isso é necessário manter a coroa do relógio para fora durante a sessão fotográfica. Claro está que, na edição, o processo de recorte e tratamento para colocar a coroa na posição correta demora tempo.
Resumo
Aqui ficaram algumas considerações sobre o desafio que é fotografar um relógio usando os Graham Chronofigter Vintage Bronze como exemplo. A dada altura na evolução do processo fotográfico a melhoria dos resultados passa em muito pelo equipamento daí que as ferramentas de edição digital sejam, quanto a mim, fundamentais para o resultado final.
Muitas vezes oiço que antigamente essas ferramentas não existiam e que os fotógrafos também faziam o seu trabalho. Verdade absoluta! Mas outra verdade é que atualmente as imagens são infinitamente melhores, mais sedutoras com mais qualidade e mais detalhe.
Cada relógio é um desafio e cada um usa os processos com que mais se sente confortável. O importante a reter pode ser resumido na célebre frase de Jean-Auguste Dominique Ingres «Só se aprende a desenhar, desenhando!» e eu, pela parte que toca e após algumas centenas de relógios, ainda tenho muito que desenhar.
—