Raymond Weil: dinastia musical

EdT53 — A Raymond Weil é uma das poucas companhias relojoeiras de certa dimensão que permanece independente e na mão da família fundadora — e é sobretudo aquela que mais intrinsecamente surge ligada ao universo musical. Desde o próprio Raymond Weil ao neto Elie Bernheim, a música tem sido um fio condutor na estratégia da marca e essa associação melómana afigura-se atualmente mais forte do que nunca.

Texto publicado no número 53 da Espiral do Tempo.

Quando se entra na casa da família Weil-Bernheim em Cologny, uma privilegiada e elegante zona residencial de Genebra, é impossível não deparar com os dois pianos da lendária Steinway & Sons no meio da sala. De certo modo, constituem um poderoso símbolo da estreita ligação da Raymond Weil à música e fazem a ponte entre as três gerações que têm conduzido a marca fundada por alguém que resolveu combater a crise que na altura vitimava dúzias de empresas relojoeiras suíças e atirava milhares para o desemprego. Os pianos pertencem a Diana, pianista profissional — filha de Raymond Weil, mulher de Olivier Bernheim e mãe de Elie, Pierre e Noemia Bernheim.

musica Raymond Weil
Família Raymond Weil/Bernheim: Raymond Weil com Olivier, Pierre e Elie Bernheim © Raymond Weil

Raymond Weil, um gentleman muito respeitado e de quem era impossível não se gostar, morreu a 26 de janeiro de 2014, aos 87 anos. Quando decidiu criar a sua própria marca, em 1976, já trabalhava no ramo há 27 anos e ousou colocar o seu próprio nome no mostrador (uma prática que na altura era considerada um sacrilégio) para se orgulhar do Swiss Made face à avalanche de relógios de quartzo provenientes do Oriente. Apresentou a primeira coleção numa mesa desdobrável na edição de 1977 da feira de Basileia e vendeu 5.000 exemplares nesse primeiro ano; no ano seguinte, o número passou para os 40.000, e, em 1982, já ascendia aos 70.000. A par do sucesso inicial, duas notas merecem relevo: numa perspetiva lusa, Portugal foi dos primeiros países a abraçar mais convictamente a nova marca; num plano estratégico, cedo foi decidido desenvolver a imagem da marca à volta da música clássica.

Olivier Bernheim, cunhado do fundador, começou a trabalhar na Raymond Weil em 1982 e assumiu o cargo de CEO desde 1996, até que, no dealbar da presente década, começou a preparar os filhos Elie e Pierre para a sucessão. Elie assumiu as rédeas da companhia no início de 2014 e Pierre desenvolve outra marca no seio familiar (a 88 Rue du Rhône); só Noemia não está diretamente ligada à relojoaria, mas pelo menos já deu o seu nome a uma das coleções.


Nomenclatura musical

Raymond Weil Nabucco Cello
Raymond Weil Nabucco Cello Tourbillon © Raymond Weil

Atualmente com mais de 3.500 pontos de venda em todo o mundo e uma produção anual de cerca de 200 mil exemplares, a Raymond Weil apresenta-se como uma sólida companhia face à difícil conjuntura económica atual e mantém-se orgulhosamente independente perante os grupos e aglomerados que caraterizam o tecido da indústria relojoeira suíça. O nome da linha Freelancer evoca essa independência e Noemia é a outra nomenclatura que, nos catálogos dos últimos anos, não está etimologicamente relacionada com o universo musical — de resto, a tradição mantém-se inabalável, com a designação de coleções como a Nabucco (batizada em homenagem a Giuseppe Verdi), Maestro, Tango ou Toccata. O historial da Raymond Weil inclui ainda nomes como Parsifal, Don Giovanni, Amadeus, Fidelio, Tosca, Allegro, Traviata, Adagio e Othello, que não deixam dúvidas quanto à inspiração melómana.

musica — Raymond Weil Maestro Frank Sinatra
Raymond Weil Maestro Frank Sinatra © Espiral do Tempo Studio

O vínculo surge atualmente ainda mais reforçado sob a liderança de Elie Bernheim, que tem aberto novos campos musicais para a marca. «A Raymond Weil está envolvida com a música desde a sua génese. A música foi fonte de inspiração no passado e hoje torna-se o veículo de valores que desejamos para a marca», sublinha o jovem CEO, que tem potenciado um plano de atividades e parcerias iniciado há já três décadas: a ligação ao inesquecível filme Amadeus, de 1984, é um marco incontornável na história da marca e catapultou as vendas da linha Amadeus na altura; já em 1986 era criada a denominada Bolsa RW para apoiar jovens músicos na apresentação pública do seu trabalho.

musica — Raymond Weil Freelancer BRIT Awards 2015
Raymond Weil Freelancer BRIT Awards 2015 © Raymond Weil

A abrangência musical foi-se alargando ao longo do tempo, sobretudo desde que foi assumida uma mediática parceria com os Brit Awards a partir de 2008, sendo que a Raymond Weil lança anualmente uma edição limitada dedicada ao certame e atribuída aos artistas nomeados e galardoados. Em 2010 e 2011, houve mesmo uma parceria com o popular concurso televisivo American Idol e, em 2011, organizou uma competição nomeada New Music Talent, que consistia em desafiar músicos amadores a criarem um tema inspirado pela marca, e divulgou os seus trabalhos através das redes sociais. A Raymond Weil tornou-se depois official timing partner do vetusto Royal Albert Hall, em 2013, ano em que também iniciou uma parceria com a Wired — uma plataforma de música ao vivo que apoia jovens músicos emergentes. Relevante é também a ligação à VH1 Save the Music Foundation, que trabalha para restaurar a educação musical nas escolas públicas americanas. Para além destas, houve também várias outras iniciativas locais ou pontuais consoante as circunstâncias e os mercados.


Pautas mais modernas

musica — 2Cellos
2Cellos — Luka Šulić e Stjepan Hauser, violoncelistas e embaixadores Raymond Weil, com o Freelancer Cello Music Special Edition. © Raymond Weil

Paralelamente a todas essas iniciativas e esses eventos, Elie Bernheim nomeou embaixadores os dois virtuosos violoncelistas Luka Šulić e Stjepan Hauser (um croata e um esloveno) que atuam sob o nome de 2Cellos, e estabeleceu uma parceria com a lendária manufatura americana de guitarras Gibson. Além disso, criou uma edição especial destinada a homenagear o eterno Frank Sinatra que conheceu enorme sucesso e nomeou a famosa violinista clássica Nicola Benedetti nova imagem da marca.

musica — Nicola Benedetti
Nicola Benedetti, violinista clássica e embaixadora Raymond Weil. © Raymond Weil

«O meu avô sempre estabeleceu o mundo musical como seu território preferencial de comunicação. A música era a paixão do meu avô e a associação melómana sempre lhe pareceu legítima. Eu tenho procurado outros horizontes para além da música clássica, que sempre foi muito importante para nós, mas também é salutar abraçarmos outro tipo de música mais contemporânea, moderna, jovem. Por exemplo, contactei com os 2Cellos porque eles representavam uma visão moderna da música clássica». E depois há a parceria estabelecida com uma marca emblemática no mundo do rock: «A associação à Gibson é-me muito cara, trata-se de uma companhia familiar com uma visão empresarial idêntica à nossa e que partilha os nossos valores. Fui a Nashville descobrir a fábrica deles e acabou por ser um dos momentos mais extraordinários da minha vida — na produção das guitarras, vê-se um savoir-faire e uma precisão com os quais me identifico, para além dos valores familiares evidentes. E, na sequência da parceria, sentimos que houve aficionados da marca a estabelecerem contacto com os nossos distribuidores em todo o mundo; trata-se de uma bela associação que é uma honra para nós», destaca Elie Bernheim.

O atual ‘regista’ da Raymond Weil tem uma formação clássica, mas não descura o pop e o rock: «A nossa família é melómana de A a Z. Comecei a tocar piano aos três anos e estudei violoncelo; a música está enraizada no meu sangue e no nosso ADN, mas não queríamos estar somente no universo do clássico». Praticamente todas as maiores vedetas da música moderna nos últimos anos receberam o seu relógio nos Brit Awards. Ano após ano, vão-se abrindo novas portas e a ligação torna-se cada vez mais relevante. Para o ano, vão ficar todos siderados com o que iremos anunciar!», revela, acrescentando que as suas preferências musicais no âmbito do pop-rock vão para os U2, Coldplay, Killers e também para «os Beatles, que amo profundamente e com os quais cresci», sem se esquecer de referenciar clássicos como Tchaikovsky ou Mendelssohn.


Música portuguesa, com certeza

A arte musical nas suas mais variadas manifestações faz parte do código genético da Raymond Weil e também inspirou várias edições comemorativas criadas em Portugal.

musica — Raymond Weil Don Giovanni Fado
Raymond Weil Don Giovanni Fado 100 anos © Espiral Studio

Em 2004, foi apresentada uma série limitada derivada da linha retangular Don Giovanni, que celebrou então os 100 anos do fado; um ano depois, a homenagem que assinalou o 80.º aniversário do célebre guitarrista Carlos Paredes, através do lançamento de um relógio da linha Parsifal. Seguidamente, o tributo a um dos maiores intérpretes portugueses de sempre:  o ‘Don Giovanni Carlos do Carmo’ foi declinado numa versão em ouro rosa dotada de um belíssimo mostrador com dois fusos horários e um fundo que, além de deixar entrever o mecanismo automático, continha a gravação dos dois primeiros acordes do tema «Estranha Forma de Vida», o primeiro fado gravado por Carlos do Carmo. A fadista Carminho, representante de uma nova maneira de cantar o fado, é embaixadora da marca.

musica — Don Giovanni Carlos do Carmo
Don Giovanni Carlos do Carmo © Espiral Studio

Internacionalmente, a Raymond Weil lançou este ano o seu relógio mais complexo de sempre — sempre sob a batuta musical: o Nabucco Cello Tourbillon inclui a primeira grande complicação da marca num mostrador esqueletizado que evoca claramente os elementos estilísticos de um violoncelo. O poderoso cronógrafo Nabucco associado à Gibson inspira-se nas seis cordas da guitarra SG Standard (best-seller da marca, a par da Les Paul), enquanto o Maestro Frank Sinatra Limited Edition é uma criação mais elegante e intemporal.

Mas haverá mais novidades em breve. Até o espaço da Raymond Weil na maior feira mundial da indústria relojoeira — Baselworld — evoca um enorme violoncelo de madeira e será lá que, no cumprimento do 40.º aniversário, será feita uma revelação muito especial. «Vão ficar todos siderados com o que iremos anunciar», promete Elie Bernheim. Para a Raymond Weil, comunicar ao som da música sempre surtiu o melhor efeito e tudo indica que a marca genebrina vai continuar a dar-nos música durante muito mais tempo… ET_simb

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