O evento organizado na sede da Zenith, em Le Locle, foi muito para além da apresentação de um novo e revolucionário sistema oscilador responsável pelo movimento mecânico mais preciso jamais produzido – foi sobretudo uma demonstração de pujança técnica do pólo relojoeiro do grupo LVMH.
Há cerca de meia dúzia de anos, numa das muitas entrevistas que Guy Sémon nos concedeu, o então responsável do departamento de pesquisa e desenvolvimento da TAG Heuer disse-me: “Miguel, tenho as gavetas cheias com dúzias de projetos incríveis. Nem imaginas o que temos por lá”. Entretanto, e sob a batuta do guru Jean-Claude Biver, Guy Sémon foi promovido a um cargo ainda mais relevante no seio do pólo relojoeiro do grupo LVMH e um dos tais incríveis projetos de que falava surgiu agora declinado no Zenith Defy Lab – apresentado com pompa e circunstância perante cerca de 300 convidados num palco especial montado ao lado da sede da histórica manufatura, em Le Locle.
Para além de 220 jornalistas especializados vindos dos quatro cantos do Planeta, viram-se também figuras institucionais do meio relojoeiro e sobretudo os responsáveis das outras marcas principais do pólo relojoeiro do grupo LVMH – Ricardo Guadalupe, CEO da Hublot, e o lendário Jack Heuer, presidente honorário da TAG Heuer, que até subiu ao palco em determinada altura (o que não deixa de ser curioso, tendo em conta que a sua marca protagonizou a grande corrida ao primeiro cronógrafo automático com a Zenith em 1969!). O evento teve a apresentação do insigne leiloeiro Aurel Bacs, assumindo Jean-Claude Biver, responsável pelo pólo relojoeiro do grupo LVMH, e Julien Tornare, o novo CEO da Zenith, o papel de anfitriões… sem esquecer o próprio Guy Sémon, agora apresentado como CEO do pomposamente designado Instituto Científico LVMH.
A ocasião não era para menos. Beneficiando das novas sinergias de grupo implementadas por Jean-Claude Biver, a Zenith apresenta no seu Defy Lab um sistema oscilador que não só é inédito no seu conceito como também capaz de promover uma precisão nunca antes vista num relógio mecânico. A própria cerimónia de apresentação foi digna da novidade, com uma passerelle central ladeada por bancadas para os convidados e drones a trazerem os dez primeiros exemplares do Zenith Defy Lab entre focos de luz e cor – após o tema ‘Start Me Up’, dos Rolling Stones (banda associada à Zenith), ter dado início aos procedimentos.
Esteticamente, o Defy Lab assume uma estrutura integrada já vista no cronógrafo Defy El Primero 21 (que bate a 360.000 vibrações/hora para cronometragem ao centésimo de segundo, dez vezes mais do que o El Primero original) desvelado pela Zenith na feira de Basileia, em março deste ano – com design de Christoph Behling, que tem contribuído para o traçado de alguns dos principais modelos TAG Heuer da última década. Para além do design integrado da caixa de 44mm, destaca-se também o tratamento ‘frosted’ que dá à superfície da estrutura em Aeronite (um compósito de alumínio nunca antes usado na relojoaria e com uma densidade de apenas 1,6kg/dm3, que é 2,3 vezes mais leve do que o titânio) um visual moderno e diferente. Mas o principal impacto vem mesmo do espetacular mostrador, que parece vivo graças à frequência ‘cardíaca’ do revolucionário sistema de oscilação.
E quais são os condimentos revolucionários do Defy Lab aclamados pela Zenith/pólo relojoeiro LVMH? Bom, desde logo a convocatória para o evento referia que se tratava da maior inovação da relojoaria mecânica desde que o cientista holandês Christiaan Huygens inventou o princípio de balanço com espiral em… 1675. O certo é que as valências do novo mecanismo falam por si – e podem ser resumidas em sete pontos:
- um oscilador monolítico feito de silício monocristalino substitui o balanço com espiral; os 30 ou mais componentes do sistema regulador tradicional são substituídos por um único elemento
- A frequência do movimento é de 15 hertz (108.000 vibrações por hora), três vezes mais do que a frequência recorde estabelecida pelo El Primero em 1969 com as suas 36.000 alternâncias/hora
- Decorrente dessa elevada frequência, a precisão tem um desvio mínimo diário de somente 0,3 segundos – um recorde na relojoaria mecânica
- A precisão mantém-se constante muito para além de 24 horas de operação, mantendo o mesmo grau de precisão ao longo de 95 por cento da sua reserva de corda (cujo total é de 60 horas)
- Não há necessidade de lubrificantes, devido ao facto de não haver pontos de contacto, fricção e desgaste
- O mecanismo tipo Carrera Heuer 01 com o mesmo sistema oscilador) e a Hublot; cional de balanço/espiral, que ficam distorcidos ou dilatados eé completamente imune à temperatura, gravidade e campos magnéticos – porque são eliminadas todas as condicionantes decorrentes do sistema tradicional de balanço/espiral, que ficam distorcidos ou dilatados e desse modo vêm a sua precisão afetada
- O Defy Lab tem certificação tripla: atestado de cronómetro de precisão passado pelo Observatório de Besançon, em nome do Gabinete Internacional de Pesos e Medidas; espectro da norma ISO-3159 aumentado para o dobro devido à variação de 0,3 segundos por dia e grau Célsio; melhoria do critério magnético da norma ISO-764 em 18 vezes, já que o relógio completo consegue aguentar campos de 88,000 amperes por metro quadrado (ou 1.100 Gauss)
Os dez relógios apresentados na cerimónia já têm destinatário (conhecidos colecionadores) e constituem uma mini-série que se assume como ponta de lança do que está para vir. E o que está para vir estende-se logicamente às restantes marcas do chamado pólo relojoeiro do grupo LVMH – a TAG Heuer (até já se viu um protótipo Carrera Heuer 01 com o mesmo sistema oscilador) e a Hublot; a Bulgari, que tem tido incríveis desenvolvimentos técnicos nos últimos tempos sob a liderança de Jean-Christophe Babin, ex-CEO da TAG Heuer, parece estar a fazer um percurso à parte dentro do grupo e a Louis Vuiton e a Chaumet pertencem a outro campeonato.
Mas porque foi escolhida a Zenith para a introdução da nova tecnologia? As razões são várias. Para além de se notar uma declarada vontade em se injetar sangue novo numa marca que passou a ter desde maio a liderança do jovial Julien Tornare, a escolha é óbvia por razões históricas: a secular manufatura recebeu 2333 prémios de precisão cronométrica desde a sua fundação em 1865, o que a torna na recipiente natural de um novo sistema ultra-preciso; e foi pioneira nas altas-frequências com o seu El Primero em 1969.
A questão que se pode colocar é: será que a modernização estética assente num design integrado não aproximará demasiado a Zenith do look também integrado do Carrera 01 da TAG Heuer e sobretudo da globalidade dos modelos da Hublot, sendo que a Zenith se vinha afirmando sobretudo pela inspiração neo-retro – tanto nos produtos como na própria estratégia de marketing (comunicação e patrocínios)? É preciso ver a evolução do catálogo nos próximos tempos, mas para já a coleção mostra uma latitude capaz de satisfazer até os mais puristas e incondicionais da marca. E a Zenith tem a sua posição reforçada enquanto principal manufatura de movimentos do grupo, capaz de produzir 40 diferentes movimentos.
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