Ainda o Watches and Wonders Geneva 2025: o rescaldo

A edição de 2025 do Watches and Wonders decorreu entre os dias 1 e 7 de abril. A organização fala em números recordes e nós, por lá, sentimos bem a dinâmica do setor relojoeiro. Alguma apreensão, mas também muito entusiasmo. Um reflexo dos tempos.

A edição de 2025 do salão Watches and Wonders Geneva revelou, acima de tudo, uma indústria muito segura do seu valor, mas também muito atenta ao mercado global. Mais do que um evento dedicado a lançamentos, o salão refletiu as temáticas transversais ao setor, claro, e as temáticas do mundo atual. Como sempre tem sido. Cada vez mais rico, cada vez mais enriquecedor e com cada vez mais marcas, o Watches and Wonders está claramente a apostar no futuro, mas com cautela. Valoriza-se as novas gerações, promove-se eventos marcantes, fala-se de temas variados numa transversalidade com outras áreas, festeja-se em grande e faz-se a ponte saudável com o passado e a tradição. E, no meio de tudo isto, é possível construir um retrato assente na força e persistência de um setor que poderia ser visto fora de moda nos tempos frenéticos que correm, mas que afinal se revela precisamente o oposto.

Com 60 marcas expositoras, o Watches and Wonders 2025 recebeu mais de 55.000 visitantes | Foto: WWGF/KEYSTONE/Cyril Zingaro

Eis alguns apontamentos que, na nossa perspetiva, marcaram a semana maravilhosa em Genebra. Apenas alguns, porque muito mais há para dizer.

Uma edição recorde

A edição de 2025 do Watches and Wonders não foi apenas marcada por lançamentos de novos relógios, mas também pelo anúncio de números recorde, de acordo com informação pós-evento. Com 60 marcas expositoras, foram mais de 55.000 as pessoas que visitaram a Palexpo, um crescimento de 12% face ao ano passado. Para os dias destinados ao público, foram vendidos 23.000 bilhetes, mais 21%, com a nota de que cerca de 10.000 jovens visitaram o salão (embora a faixa etária aqui não tenha sido descriminada nos dados divulgados).

Visitantes durante o Watches and Wonders Geneva no programa ‘In the City’, em Genebra, no dia 3 de abril | Foto: WWGF/KEYSTONE/Valentin Flauraud
O mundo encantado da Van Cleef & Arpels no Watches and Wonders geneva 2025 | Foto: WWGF/KEYSTONE/Cyril Zingaro
A exposição ‘Longitude 0°’  com fotografias de Fred Merz | Foto: WWGF/KEYSTONE/Cyril Zingaro

A organização manifesta assim a sua satisfação face ao evento que também viveu fora de portas, com diversas iniciativas no centro de Genebra com o programa ‘In the City’, bem como outros eventos promovidos pelas marcas. Com mais marcas, mais visitantes e uma programação complementar reforçada, o Watches and Wonders consolidou-se como um ponto de encontro incontornável da relojoaria contemporânea. Sem esquecer tudo o resto que decorreu paralelamente ao longo da semana: algumas marcas prestigiadas a expor em showrooms de consagrados hotéis em zonas nevrálgicas da cidade e a feira paralela Time to Watch, este ano organizada mesmo ao lado da Palexpo.

Grande aniversários

Se há algo que a relojoaria sabe fazer bem é celebrar a passagem do tempo — e esta edição foi exemplo disso mesmo. Aqui na Espiral do Tempo já tínhamos feito referência a diversos aniversários e no Watches and Wonders alguns desses aniversários deram o mote para lançamentos e edições comemorativas, com especial destaque para os 270 anos da Vacheron Constantin. Além de ter lançado o mais complicado relógio de pulso alguma vez concebido, com 41 complicações, a marca genebrina brindou-nos com diversos modelos nas coleções Patrimony e Traditionelle que têm como fio condutor um mostrador que tem a cruz de malta — alusiva à marca — como base decorativa.

A celebração dos 270 anos da Vacheron Constantin também se fez ver no espaço da marca | Foto: Cesarina Sousa/ Espiral do Tempo
Vacheron Constantin Traditionelle Moon Phase | Foto: Cesarina Sousa/Espiral do Tempo

Já numa linguagem totalmente diferente, a Hublot celebrou em grande as duas décadas do Big Bang, um modelo que, apesar da sua juventude relativa, já pode ser considerado um ícone contemporâneo, pelas suas linhas fortes e evolução contínua. Com Julien Tornare agora à cabeça da marca, assistimos assim ao lançamento de uma coleção de cinco relógios dedicados a esta celebração. Além disso, a Hublot organizou uma grandiosa festa com a presença de diversos embaixadores e amigos da marca, bem como de Mika que garantiu aos convidados um concerto memorável. Neste mesmo evento, Jean-Christope Babin fez a sua aparição enquanto novo CEO da LVMH Watches (apesar de manter a sua posição enquanto CEO da Bulgari) com um emotivo discurso que revelou a sua satisfação neste momento de viragem.

Para celebrar os 20 anos do Big Bang, a Hublot organizou uma grandiosa festa que contou com a presença de diversos amigos e embaixadores da marca, bem como o cantor Mika, para um concerto exclusivo | Fotos: Espiral do Tempo

Regresso a outros tempos

A TAG Heuer, liderada agora por Antoine Pin, surpreendeu com o lançamento de uma campanha publicitária repleta de força que evoca os bons velhos tempos de slogans como ‘Don’t Crack Under Pressure’ e ‘Sucess is a Mind Game’. Esta aposta aborda diversos desportos através de um vídeo que tem como slogan ‘Designed to Win’. No ano em que a TAG Heuer regressa ao palco da Fórmula 1 enquanto cronometrista oficial, a herança automóvel fez-se bem ver em especial no stand da marca, mas também através do regresso da colorida coleção Formula 1. Durante o Key Note no qual foi apresentada a campanha, estiveram presentes Mika Hakkinen, Carl Lewis e Summer McIntosh como exemplos da força mental que dá o mote para a campanha.

Inspirada pela sua herança, a TAG Heuer lançou uma nova campanha e recupera a coleção Formula 1. A marca é atualmente a Official Timekeeper do Campeonato de Formula 1, numa mediática aposta que acaba por ser também um regresso a outros tempos | Fotos: Cesarina Sousa/Espiral do Tempo e WWGF/KEYSTONE/Cyril Zingaro (foto da direita)

Também a Roger Dubuis conseguiu surpreender, ao apostar este ano num regresso às origens da marca e numa evocação do seu legado, no âmbito da celebração das suas três décadas de vida. Neste sentido, o resultado da união entre o mestre suíço Roger Dubuis e o empresário português Carlos Dias em 1995 volta a ganhar forma nos novos Excalibur Grande Complication e Excalibur Biretrograde Calendar que evocam o mostrador Biretrograde. O enquadramento dos novos modelos foi feito no stand através de vários expositores que recuperaram antigos modelos da Roger Dubuis. Para muitos, esta era mesmo uma aposta que muitos saudosistas da marca desejavam.

As tendências

O Big Crown Pointer Date num animado tom de amarelo | Foto: Miguel Seabra/Espiral do Tempo

Já falámos de uma ou outra e continuaremos a falar de algumas tendências estéticas bem claras que se fizeram notar. Assim, numa primeira análise podemos falar de cores (muitas) nos mostradores. A Oris com os seus Big Crown Pointer Date, a H.Moser & Cie com a sua Pop Collection, a TAG Heuer com os Formula 1, a Patek Philippe com a exploração dos tons azuis, a Rolex com os bonitos Oyster Perpetual, a Hublot com a exploração das cores através da cerâmica, a habitualmente monocromática Nomos com o novo Club Sport Neomatik Worldtimer; a Zenith surpreendeu com um tom de azul profundo em todas as suas novidades comemorativas. A utilização de pedras nos mostradores é também por si só uma tendência que contribui para esta variada paleta de cores, com ênfase, neste caso, na Chopard, na Piaget, na H.Moser & Cie e até a Rolex, com o seu GMT-Master II com mostrador em olho de ferro.

A nova Pop Collection da Moser & Cie. inclui diversos modelos com as mais variadas cores | Foto: Cesarina Sousa/Espiral do Tempo

Depois, a diversidade de braceletes é cada vez mais interessante, tanto no domínio das braceletes metálicas (em especial em malha milanesa, como no novo Reverso Tribute Monoface, ou de inspiração vintage como a Settimo do Rolex 1908) e estruturas integradas, como noutras opções mais casuais ou requintadas — a Van Cleef equipou mesmo os seus novos Pont des Amoureux com braceletes totalmente cravejadas. Sistemas exclusivos de microajuste e sistemas de troca fácil são também cada vez mais vistos, numa resposta à versatilidade que faz a diferença nos dias que correm.

No pulso: o Reverso Tribute Monoface Small Seconds com a bracelete em malha milanesa | Foto: Cesarina Sousa/Espiral do Tempo
O Reverso Tribute Monoface Small Seconds com a bracelete em malha milanesa | Foto: Cesarina Sousa/Espiral do Tempo

De notar ainda, os tamanhos dos relógios. Curiosamente, a tendência de relógios mais pequenos está a dar lugar a um certo equilíbrio: enquanto há marcas a apostar na redução das dimensões, há outras a apostar num certo crescimento comedido. A lógica parecer ser a possibilidade de adaptação a diferentes tamanhos de pulsos e diferentes gostos também. O 1815 da A.Lange & Sohne, agora com 34mm, é um bom exemplo, assim como o novo Black Bay 68 com caixa de 43mm.

Dentro e fora da caixa

Um divertido tributo ao mundo equestre: no Hermès Arceau Rocabar de Rire o cavalo deita a língua de fora quando se pressiona o botão inserido na coroa | Fotos: Cesarina Sousa/ Espiral do Tempo
O Le Temps Retrouvé é um busto que guarda um complexo relógio mecânico de mesa; já a Hautlence surpreendeu com um bem disposto relógio de pulso que se transforma num robot. Chama-se Retrovision ’85 e é inspirado numa peça da década de 1980 | Fotos: Cesarina Sousa/ Espiral do Tempo
O Land-Dweller da Rolex foi um dos protagonistas do evento | Foto: WWGF/KEYSTONE/Cyril Zingaro

Foi engraçado ver um certo contraste nos lançamentos: por um lado, a aposta em valores seguros, consagrados, como o Reverso da Jaeger-LeCoultre, o Big Bang da Hublot, o Black Bay da Tudor, o Patrimony e o Traditionelle da Vacheron Constantin ou até mesmo o J12 da Chanel reavivado por tons de azul escuro profundo, por outro lado, alguns lançamentos fora da caixa muito interessantes, como o Tokyo Lion Tentagraph da Grand Seiko, o divertido Retrovision 85′ da Hautlence, o novo Land-Dweller da Rolex, o notável Les Cabinotiers Solaria Ultra Grand – La Première da Vacheron Constantin ou até mesmo a Chanel e a Trilobe com dois incríveis relógios de mesa.

Pulsos femininos

Uma nota especial para os relógios dedicados aos pulsos femininos. Se acima fizemos referência à variedade de tamanhos, podemos dizer que também gostámos muito de ver a atenção que este ano foi dada às linhas de senhora.

O novo Sixtie da Piaget | Foto: Cesarina Sousa/ Espiral do Tempo
O Twenty~4 Automatic Perpetual Calendar da Patek Philippe e o Reverso One Precious Flowers da Jaeger-LeCoultre | Fotos: Cesarina Sousa/ Espiral do Tempo

A Piaget apresentou o Sixtie, uma nova coleção de formato trapezoidal que se revela muito sofisticada; a Vacheron Constantin celebra também os seus 270 anos com dois modelos Traditionelle com mostrador em madrepérola decorado com um padrão inspirado na cruz de Malta, um deles com indicação lateral das fases da Lua; a JaegerLeCoultre volta a apostar nos sempre bonitos Reverso One Precious Colours e Precious Flowers, com diferentes motivos decorativos; a Patek Philippe aposta não apenas em novas cores na linhagem Nautilus Quartz, como também dotou o seu Twenty~4 Automatic com calendário Perpétuo.

Três dos cinco relógios que compõem o coffret J12 ‘Dripping Art’ | Foto: Cesarina Sousa/Espiral do Tempo
O novo Cartier Tressage e o Ingeneur da IWC lançado agora numa edição com 35,5mm

Em destaque também esteve também a Oris com o seu ProPilot X Miss Piggy, a Cartier com o novo Tressage, a Bulgari com uma nova interpretação do seu Serpenti e a Chanel com os seus inúmeros e criativos lançamentos, dos quais sobressai a coleção Blush, com tons, texturas e efeitos lacados inspiradas nas linhas gráficas e nas cores do mundo da maquilhagem da marca francesa. Faremos em breve uma seleção de relógios femininos.

Os stands

Por mais que tentemos passar para palavras, é sempre um desafio descrever não apenas o ambiente e dinâmica do Watches and Wonders, mas também a dimensão do próprio espaço. Os vastos corredores, animados por zonas de restauração e de descanso, são a ponte para os stands das marcas ali presentes. Algumas casas optam por manter a decoração de ano para ano, outras preferem mudar de acordo com uma temática específica ou o fio condutor dos lançamentos.

A Montblanc simulou uma cabana de montanha como entrada do seu stand | Foto: Cesarina Sousa/Espiral do Tempo
Parece o mar, mas é antes o teto do stand da Panerai, que privilegiou este ano a sua herança marítima | Foto: Cesarina Sousa/Espiral do Tempo
O stand da Cartier é sempre uma surpresa | Foto: WWGF/KEYSTONE/Cyril Zingaro

ESte ano notou-se uma maior liberdade na apresentação de alguns stands (nomeadamente da TAG Heuer e da Hublot), que nos tempos do Salon International de la Haute Horlogerie e nos primeiros anos da Watches and Wonders eram mais uniformes — com a exceção da Rolex, da Patek Philippe, da Chopard e da Tudor, que manteviram as mesmas estruturas que apresentavam em Baselworld. De qualquer forma, todos os anos, cada um destes espaços exclusivos acaba por surpreender, seja pela sua sofisticação, sejam pelo modo como refletem a linguagem, os valores e a atualidade das próprias marcas. São sempre boas surpresas e bons lugares para espairecer também.

O fantasma das tarifas

Uma das entradas para o Watches and Wonders 2025 | Foto: WWGF/KEYSTONE/Cyril Zingaro

Por fim, num evento que vive tanto da paixão como do negócio, a ameaça das tarifas de importação para produtos importados da Suíça a serem impostas pelos EUA foi tema quente durante a semana do Watches and Wonders, com inevitáveis conversas e alguma apreensão. Afinal, a relojoaria suíça em geral e diversas marcas em particular dependem fortemente do mercado norte-americano. De acordo com a Fédération de l’industrie horlogère suisse (FH), os Estados Unidos figuravam como o principal mercado das exportações relojoeiras suíças no período de janeiro e fevereiro de 2025, um crescimento de 4,2% face ao mesmo período no ano anterior. Em segundo lugar figura Hong Kong, seguindo-se China, Japão e Singapura. Os produtos importados da Suíça serão taxados em 31% nos Estados Unidos.

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