Salon Belles Montres: dilema parisiense

Em Paris — A nona edição do Salon des Belles Montres não correu tão bem como se desejaria, nem mesmo num novo formato com suporte de moda masculina. De qualquer das formas, houve relógios muito interessantes para ver no Caroussel du Louvre. Aqui ficam alguns deles e a análise ao futuro incerto da mais conhecida exibição relojoeira realizada em solo francês.

‘Ou vai ou racha’ será uma boa tradução livre para a tirada ‘Rebondir ou Mourir’ que o meu colega François-Xavier Overstake usou para definir o futuro do Salon Belles Montres. Porque, de facto, as próximas edições apresentam-se algo incertas tendo em conta a insatisfação generalizada entre marcas expositoras, membros da imprensa e até mesmo visitantes da nona edição do mais relevante certame relojoeiro francês.

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Porque é que o SalonQP que se realiza em Londres escassas semanas antes parece florescer de ano para ano e o Salon Belles Montres de Paris tem vindo a embrenhar-se num ciclo vicioso de inerente frustração? Afinal de contas, trata-se de uma grande e populosa metrópole que passa por ser também a capital mundial do luxo com sensibilidade e história mais do que suficientes para uma devida apreciação do fenómeno relojoeiro. O certo é que, apesar da adesão de várias manufaturas relevantes de alta-relojoaria e suficientes marcas independentes, o evento não logrou fomentar um entusiasmo suficiente que deixe bons augúrios para o futuro.

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Claro que os atentados de duas semanas antes ensombraram a cidade e possivelmente travaram uma eventual maior adesão popular. Esse pormenor trágico poderia e deveria ter sido compensado pela circunstância de, neste ano, a feira de relojoaria se associar a uma exposição de moda masculina com várias marcas de vestuário, calçado e acessórios a ajudarem a completar o enorme espaço subterrâneo da Sala Gabriel Delorme no Caroussel du Louvre. Para além da proximidade com o Natal poder entusiasmar mais o negócio.

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Entre sexta-feira e domingo não houve um fluxo de visitantes (aficionados ou profissionais) considerado minimamente satisfatório tendo em conta o investimento feito pelas pelas marcas expositoras e, em vez de um claro aproveitamento de sinergias entre a parte dos relógios e a parte fashionista, pareceu haver dois universos demasiado distintos entre eles — quando hoje em dia a mistura da relojoaria de prestígio com lifestyle e moda masculina tem sido uma receita de sucesso evidente em revistas da especialidade e sobretudo numa plataforma tão assente na imagem como o Instagram. Para mais, contrastando com a carregada agenda cultural diária do SalonQP, houve um único simpósio dedicado à relojoaria nos três dias e meio do evento parisiense. E uma única exposição complementar, dedicada à temática dos relógios eróticos.

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O espaço da Vacheron Constantin apresentava-se como o mais aliciante, não só pela amplitude mas também pelo requinte e até pela mesa de relojoeiro — sem esquecer os relógios, claro. E não podíamos deixar de tirar uma fotografia ao novo cronógrafo Cornes de Vache, mais um excelente exercício de estilismo neo-rétro com um mostrador embelezado por escalas e uma caixa com as asas de gota que lhe dão o nome.

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A Lange & Söhne tinha como vedeta o Zeitwerk Minute Repeater, o modelo de repetição de minutos decimal que recebeu vários galardões por esse mundo fora e que foi seguramente um dos mais destacados relógios do ano.

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A Girard-Perregaux também apresentou uma mesa de relojoeiro (subterfúgio sempre óbvio para dar animação a cada espaço e atrair os aficionados puros e duros) e vários modelos interessantes, incluindo novas versões do Constant Escapement LM que em 2013 ganhou o principal galardão no Grand Prix d’Horlogerie de Genève. Para além de uma nova versão do Seahawk que apreciei particularmente.

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A Cvstos, que se estreava no certame, teve um imponente stand com duas grandes referências francesas associadas a duas linhas de relógios – por um lado os modelos de tributo a Gustave Eiffel, incluindo o novo turbilhão; por outro, os dedicados a Gérard Dépardieu com a águia imperial dos Romanov integrada no mostrador, sendo o mais recente a versão cronógrafo.

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A Czapek voltou a estar presente, depois de ter já feito a sua estreia no SalonQP — uma marca que ressuscita um nome lendário da relojoaria, já que Franciszek Czapek trabalhou com Antoni Patek imediatamente antes de uma cisão que conduziria à criação da Patek Philippe. Este Quai des Bergues nº31, de mostrador em esmalte Grand Feu e caixa em ouro rosa de 42,5 mm, é um dos quatro modelos inaugurais assentes no mesmo calibre com uma reserva de corda de 168 horas.

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A Oris é uma marca muito popular em França e o seu stand foi muito concorrido, sendo que o grande interesse residia nas versões Heritage Diver Sixty Five — incluindo a mais recente com mostrador Deauville azul e cinzento, estreada ‘em pessoa’ precisamente no Salon Belles Montres.

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A Ralf Tech apresentou vários modelos com movimento de manufatura, com o seu fundador Franck Huyghe a destacar-nos o Vortex com horas saltantes em janela digital, ponteiros dos minutos e segundos ao centro e indicador de reserva de corda.

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A March LA.B (Los Angeles — Biarritz) é outra marca francesa muito interessante que baseia toda a sua identidade no imaginário dos anos 70, apresentando na sua coleção relógios de forma com movimentos automáticos e de quartzo a um preço muito interessante.

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A March LA.B, por exemplo, tem uma loja própria no Marais que lhe serve de quartel-general. Não se pode esquecer que a esmagadora maioria das marcas já dispõe de uma boutique própria em Paris ou está representada em grandes espaços de luxo — desde o department store exclusivamente relojoeiro da Bucherer ao departamento de luxo do department store da Printemps, passando pela Dubail. Locais aos quais o grande público, nomeadamente o francês, já tem acesso ao longo do ano para manusear os relógios e ver as novidades (e o Salon Belles Montres nasceu muito a pensar nesses aficionados). Talvez o ideal fosse fazer emergir o Salon Belles Montres do espaço subterrâneo no Caroussel du Louvre para um ambiente mais prestigiado e arejado. De qualquer das formas, espera-se que o evento tenha um futuro mais auspicioso do que aquele que aparenta ter — e cá estaremos para os desenvolvimentos, enquanto esperamos também o advento de um certame do género em Portugal. ET_simb

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