A Jaeger-LeCoultre aposta este ano na renovação do Duometre. No Watches and Wonders Geneva, a Grande Maison lançou quatro modelos nesta coleção, com o Heliotourbillon Perpetual como estrela maior. Em entrevista, Catherine Renier, CEO da marca, falou-nos sobre esta e outras novidades, mas também sobre o atual momento. E sobre o futuro.
Em Genebra
Na linha Duometre, quem vê cara vê corações. Ou melhor, vê ‘cérebros’, se quisermos abordar de forma mais específica o conceito Dual-Wing que está na sua base. Lançado em 2007 pela Jaeger-LeCoultre com a estreia de um modelo cronográfico, o Duometre integra no mesmo relógio um sistema de dois mecanismos e correspondentes fontes de energia, mas com funções e funcionalidades distintas.
As vantagens são claras, como explicou há uns anos Christian Laurent – na altura o mestre relojoeiro responsável pelo atelier que desenvolveu a coleção: «Cada modelo é um relógio com dois cérebros; o sistema Dual-Wing consiste em dois mecanismos distintos reunidos numa mesma caixa de relógio e o conceito assenta sobretudo numa força constante dedicada à precisão que não só dá ao relógio a exatidão de um cronómetro como também a possibilidade de se adicionarem complicações que não incidem perniciosamente sobre a precisão.»
Depois da estreia do Duometre à Chronographe, seguiram-se o Duometre à Quantième Lunaire e o Duometre Sphérotourbillon e todos eles destacavam no mostrador o conceito de duplicidade técnica que está na sua base. Agora, a Jaeger-LeCoultre aposta na renovação desta família que nunca deixou de ser residente no seu portefólio, como forma de sublinhar a ideia de ‘Precisão’, fio condutor da estratégia da marca para 2024. Assim, a coleção Duometre recebeu diversas alterações e quatro novas interpretações: o Duometre Chronograph Moon, o Duometre Quantieme Lunaire e o Heliotourbillon Perpetual.
Antes e durante o Watches and Wonders, tivemos a oportunidade de falar sobre estas novidades com Catherine Renier, mas também sobre o atual momento da marca. E sobre o futuro. Aqui fica a entrevista devidamente editada e adaptada, de modo a incluir as abordagens de ambos os momentos em que falámos com a CEO da Jaeger-LeCoultre.
Antes de seguirmos para 2024, o que nos pode dizer sobre 2023? O ano passado foi um ano para recordar?
O ano de 2023 foi um ano fantástico para a Maison, com um incrível feedback em relação ao Reverso. A introdução do Reverso Chronograph, em particular, foi muito apreciada e conheceu um tremendo sucesso em todo o mundo. Penso que com este lançamento e com o trabalho que foi feito na coleção conseguimos trazer realmente o Reverso de volta para a ribalta, e expressar uma importante assinatura da Maison nas vertentes de design, com o Reverso, e das complicações que sabemos dominar, com o cronógrafo. Portanto, 2023 foi um ano muito forte.
Agora, em 2024, embarcamos com o Duometre na Precisão (Precision), que será o tema deste ano. Claro que teremos também novidades na linha Polaris e na linha Reverso ao longo do ano. Não as revelamos todas aqui. Mantemos algumas guardadas, de maneira a deixar que cada coleção e cada história brilhe por si só. [Entretanto, a marca já apresentou o Calibre Master Grande Tradition 948 e novos designs na linha Reverso One]
Qual é a estratégia geral da marca para 2024?
Este ano celebramos a ‘Precisão’, a alta-relojoaria, as complicações, abordando mesmo a perícia e perícia técnica da Maison. Assim, esse é o foco no que diz respeito ao produto; depois iremos celebrar diversas boutiques flagships em todo o mundo, incluindo a abertura de uma flagship em Pequim. Portanto, além do produto, é muito importante para nós oferecer experiências e dar ao nosso cliente uma compreensão da Maison através destas boutiques que são um importante passo para o futuro. Isto vai acontecer em 2024, mas continuaremos também a ter exposições itinerantes pelo mundo. Em particular, a exposição ‘Precision’ que vai estar patente no Dubai e em Pequim.
E a exposição dedicada ao Reverso?
A exposição ‘Reverso’ esteve em Nova Iorque no passado mês de novembro e vai estar patente, em dimensões mais pequenas, em Sidney, no mês de maio. O mundo é grande!
Em relação aos lançamentos de 2024, o que há de novo?
Estamos muito orgulhosos por termos recuperado uma inovação de 2007, o Duometre, e por retrabalhá-la de acordo com um perfil contemporâneo. Retrabalhámos a complicação, acrescentado uma lua ao cronógrafo, e retrabalhámos a caixa, inspirados num relógio de bolso do final do século XIX. A caixa é muito suave e de forma muito arredondada. Nela é possível ver a beleza dos acabamentos entre o metal e o vidro. Não se tem efetiva noção de qual é o ponto em que começa, dando uma impressão de verdadeira fineza.
Também trabalhámos muito no redesign do mostrador, nos acabamentos e, claro, no movimento. Temos, assim, uma coleção que é um tributo ao nosso passado e à nossa herança no que diz respeito à precisão no Duometre, mas que traz uma sensação e um look muito contemporâneos com uma expressão de tradição relojoeira.
Este ano foram apresentados diversos modelos com a solução de vidro elevado – tipo glassbox.
Sim, é interessante. No entanto, na glassbox, o vidro eleva-se sem ser na perfeita continuidade da caixa. A especificidade no Duometre é que, se tocarmos na lateral do relógio, há uma sensação de continuidade entre o metal da caixa e o vidro. Portanto, não é glassbox, mas uma continuidade que significa, mais uma vez, um muito elevado nível de precisão, numa muito complexa construção. A caixa tem mais de 30 partes.
Qual é a importância da coleção Duometre para a Jaeger-LeCoultre?
É uma coleção de nicho, mas, acima de tudo, é uma assinatura, porque se trata de um importante elemento da identidade para a Maison no que diz respeito à perícia técnica. Temos 1300 calibres no nosso portefólio e a linha Duometre tem alguns no seu catálogo com este realmente especial duplo tambor e duplo trem de rodagens. Sabemos como olhar para o portefólio e focar-nos naquilo que foi realmente reconhecível para a Jaeger-LeCoultre. Outra importante assinatura para a Maison, por exemplo, é o Calibre 101. Assim, o Dumetre integra-se nesta categoria: coloca-nos à parte na complexidade do movimento e na especialidade que traz à indústria.
E em que medida representa o percurso da marca?
Esta coleção é uma forma de expressar o modo como a Jaeger-LeCoultre encontrou sempre soluções para embarcar numa jornada de relojoaria, de busca da precisão, acrescentando um nível de complexidade que tem como objetivo servir melhor as funções relojoeiras e as complicações. Esta ideia base de dois trens de rodagens é por si só um avanço e uma ruptura que nos são muito queridos. O Duometre é uma coleção de nicho e uma forte expressão relojoeira que estamos a proteger e que levou tempo a revisitar. A caixa é como nenhuma outra na nossa coleção e fazer uma caixa para quatro referências é também um statement daquilo que somos capazes, da paixão e do sentido de detalhe para fazer desta uma coleção única e a expressão de uma relojoaria tradicional e elegante.
O conceito Duometre + o recém-desenvolvido ‘helioturbillon’ + o calendário perpétuo + a indicação de grande data. O novo Duomètre Heliotourbillon Perpetual soa a ‘super relógio’…
É para nós a estrela da semana, do ano. Com base Duometre, potanto com duplo tambor, e um novo turbilhão multi-eixo, também uma assinatura da marca, desde que lançámos e revelámos o Gyrotourbillon, em 2004. Temos uma nova cinética no heliotourbillon, com três eixos interligados para o heliotourbillon girar e cobrir o maior número possível de pontos de gravidade e manter a precisão no seu melhor no interior do relógio. Temos uma nova caixa e muita decoração feita e pintada à mão por trás do heliotourbillon. Por outro lado, há que referir a patente integrada no calendário perpétuo: o número vermelho significa que 2024 é um ano bissexto. Essa patente implicou um engenhoso mecanismo.
Quais os principais desafios na criação desta peça?
Cinco anos… Foram precisos cinco anos para o heliotourbillon, para a caixa e para unir todos estes elementos, desde o momento em que foi desenhado até à realidade. A montagem do heliotourbillon, a complexidade da caixa e do mostrador fazem parte de um longo processo que requer cada secção da manufatura: pesquisa, construção, prototipagem, laboratório e, finalmente, relojoeiros com elevadas qualificações.
- Jaeger-LeCoultre Duometre Heliotourbillon Perpetual | Foto: Cesarina Sousa/ Espiral do Tempo
- Calibre 388 de corda manual que equipa o Duometre Helioutourbillon Perpetual | Foto: Cesarina Sousa/ Espiral do Tempo
- Jaeger-LeCoultre Duometre Chronograph Moon | Foto: Miguel Seabra/ Espiral do Tempo
- Calibre 391 de corda manual do Duometre Chronograph Moon | Foto: Cesarina Sousa/ Espiral do Tempo
- Jaeger-LeCoultre Duometre Quantieme Lunaire | Foto: Miguel Seabra/ Espiral do Tempo
- Jaeger-LeCoultre Duometre Chronograph Moon | Foto: Miguel Seabra/ Espiral do Tempo
- Jaeger-LeCoultre Master Ultra Thin Perpetual Calendar | Foto: Miguel Seabra/ Espiral do Tempo
- Jaeger-LeCoultre Duometre Chronograph Moon | Foto: Miguel Seabra/ Espiral do Tempo
A Jaeger-LeCoultre está a lançar mais um calendário perpétuo em 2024, ano bissexto. Na sua perspetiva, esta complicação pode ser mais apelativa para os clientes durante um ano bissexto?
Aconteceu, não o calculámos dessa forma, mas é verdade que o ano bissexto e outras anomalias, tal como falámos na nossa Odisseia Celestial há uns anos, é uma das complicações celestiais que dá muitas dores de cabeça e muito trabalho aos nossos relojoeiros! Desta vez, com o Helitourbillon e Grande Data temos uma patente para destacar o ano bissexto com uma cor diferente. O número é vermelho para mostrar que se trata de um ano especial, portanto ainda hoje o ano bissexto continua a dar origem a novas patentes e novas inspirações. Por isso, penso que é uma benção nestas linhas, é uma complexidade, mas também uma forma de expressar inovação e trazer algo diferente. Vamos ver se teremos muitos clientes para o calendário perpétuo amanhã (risos) [esta pergunta foi feita antes do Watches and Wonders, no dia 28 de fevereiro de 2024, daí a referência ao dia seguinte].
Agora que estamos no Watches and Wonders qual está a ser o feedback e quais são as suas expectativas em relação a este ano?
Foi outra vez uma edição com um feedback muito positivo em relação à Maison, à indústria, ao stand, à experiência, ao storytelling que a Jaeger-LeCoultre está a fazer, e aos produtos. É sempre um risco quando tocamos num produto que existe, embora neste caso não seja assim tão antigo. Muitas pessoas assistiram ao lançamento do primeiro e nunca sabemos se seremos compreendidos no modo como retrabalhámos a coleção. Até ao momento, recebemos um feedback fantástico, muito alinhado com o que fizemos. Portanto, tem sido muito positivo, o que nos dá tranquilidade no potencial desta coleção e no facto de ir ao encontro das expectativas de hoje para o Duometre.
Retrabalharam a coleção Duometre e agora quando vamos assistir ao regresso do Master Compressor?
Não sei…Veremos. Trabalhámos muito no Polaris nos últimos anos, o Duometre ainda estava na coleção, portanto estamos a substituí-lo e o Master Compressor já não está na coleção, pelo que estaríamos a acrescentar. Não é a prioridade do momento, mas nunca está longe da nossa mente.
Qual a importância do projeto Made of Makers?
O projeto Made of Makers já decorre há alguns anos, com diferentes artistas. Trabalhámos com artistas digitais, tipógrafos, artistas culinários, como este ano. A Maison apresenta uma temática a cada artista – ‘Precision’, ‘Golden Ratio’, ‘Art Deco’, por exemplo – e pede-lhe para interpretar essa temática de acordo com a sua própria expressão artística. Este ano, trabalhamos com um chef, um artista de culinária e ele fez quatro pratos nos quais a precisão e o mix entre o Vallée de Joux [onde fica sediada a marca] e as suas raízes indianas são a base das suas criações: a precisão na forma, ou nos ingredientes ou no processo de cozinhar.
Este é o resultado da inspiração que a Jaeger-LeCoultre lhe passou quando ele visitou a manufatura.Portanto, andamos fazer isto há uns anos com diversos artistas, sempre com almas muito bonitas, criativas e abertas a compreender a nossa indústria, o nosso mundo. São sempre encontros giros que trazem muito às nossas histórias, à explicação do nosso mundo e que também permitem que pessoas menos dentro da relojoaria compreendam a Jaeger-LeCoultre e entrem no nosso mundo.
Como é possível cativar as novas gerações para o mundo da alta-relojoaria e da relojoaria mecânica?
Penso que a alta-relojoaria acarreta consigo valores muito importantes para as novas gerações. Faz um balanço entre a rápida obsolescência do mundo da tecnologia e o respeito pela herança, artesanato e intemporalidade. Acredito que qualquer um, em determinada altura, precisa na vida da conveniência da tecnologia, mas também da tranquilidade e beleza da herança e do artesanato. Vi-se durante a Covid como esta vertente se tornou proeminente, porque precisamos da segurança, das raízes para tudo fazer sentido. E a relojoaria foi muito suportada por este espírito durante o período de Covid e nos últimos anos. Por isso, estamos positivos. Os visitantes que tivemos durante esta semana são cada vez mais novos e isso é muito bom.
Enquanto CEO, como vê que a Jaeger-LeCoultre é atualmente percebida pelo público?
Temos trabalhado em diversos aspetos nos últimos anos. Em primeiro lugar, queremos destacar a nossa perícia, criatividade e inovação, bem como o facto de ousarmos tentar coisas, de investir neste importante lado da nossa identidade. Temos um estúdio completo, equipas de pesquisa e de desenvolvimento a trabalhar a alta velocidade para as inovações de amanhã. Isto é muito importante para nós e espero que isto seja percecionado pelos olhos do público e é essa a razão pela qual modelos como o Duometre estão em foco no Watches and Wonders e pela qual as complicações, ao longo dos anos, são uma importante mensagem que as nossas novidades passam.
Por outro lado, queremos destacar a nossa herança, o nosso know how em calibres e manufatura no sentido de formar o público em geral para o mundo da relojoaria. Ninguém precisa hoje de um relógio, logo é importante mostrar qual é o significado da relojoaria. Para mim, o significado da relojoaria é o respeito pelo património, é a tradição, é o trabalho de manufatura elevado a outro nível de expertise e de conquistas incríveis – tal como a Formula 1 para os carros – de um mecanismo que pode funcionar para sempre. Por isso, temos intemporalidade, temos respeito pela herança e inovação e criatividade que são extremamente fortes na relojoaria. Queremos transmitir tudo isto e fazemo-lo através de exposições que viajam pelo mundo, através do nosso Atelier de Antoine, workshops imersivos e abertos a todos, desde colecionadores a ‘noviços’ na relojoaria.
Por fim, obviamente que é importante também partilhar lado de modernidade da Maison, através das nossas campanhas, dos nossos embaixadores. A nossa forma de nos expressarmos tem evoluído ao longo dos anos, incluindo o nosso programa Made of Makers, de modo a trazer uma dimensão artística que nos é querida em tudo aquilo que diariamente fazemos mas que nem sempre é percecionada. Desta forma, abrimo-nos a outras artes e artistas. Esperamos assim que o público consiga apanhar tudo isto ou pelo menos partes dos aspetos que referi. Mas pode ter a certeza de que são estas as mensagens que nos guiam e nos inspiram para os próximos anos, tal como aconteceu nos últimos anos.