A bela relojoaria mais acessível e a dolce vita cruzaram-se num novo evento bienal em Milão que teve muitas novidades e múltiplos focos de interesse. A Espiral do Tempo esteve lá, disfrutou e conta como foi.
Em Milão
A Milano Watch Week surgiu em 2024 como um novo evento bienal no calendário relojoeiro internacional, inspirado pela Dubai Watch Week — com a adesão de marcas independentes de alta relojoaria e mais algumas pertencentes aos grandes conglomerados do luxo. Nos anos intercalares, a mesma organização resolveu anfitriar um evento não muito distinto mas dedicado a marcas de preço mais acessível ou micromarcas — e foi assim que nasceu o After Time by Milano Watch Week, que recentemente se realizou na capital do norte de Itália e que deu o mote para um animado derradeiro trimestre de 2025 no que diz respeito a certames da indústria.

E edição deste ano do After Time não se desenrolou apenas como um evento, mas sobretudo como uma experiência aliciante para os verdadeiros aficionados — uma imersão em estilo, artesanato e conversas que se espraiou por três distintos locais e uma série de ativações à italiana. Porque, em Itália e sobretudo em Milão, o tempo corre de forma diferente: com muita sprezzatura, um termo transalpino que se pode traduzir por… desprendimento com estilo.

Independentemente do estilo e tendo igualmente em conta o evento do ano passado, a iniciativa milanesa promovida pela equipa da plataforma Italian Watch Spotter consolidou-se como um dos encontros mais revigorantes do cenário relojoeiro internacional. Ao longo de três dias, mais de 2.700 visitantes exploraram os três locais que serviram de palco ao After Time: os espaços contíguos na Via delle Ore 3 e na Via Santa Tecla 3, e novamente o Terrazza Martini com vista altaneira para a praça do Duomo e a Galeria Vittorio Emmanuele.

Tratou-se de uma imersão na relojoaria contemporânea, no design diferenciado e na cultura transalpina; longe de uma feira comercial convencional, o After Time 2025 adotou um formato acessível e voltado para a comunidade relojoeira, onde experientes colecionadores, especialistas do setor e mesmo novos aficionados puderam interagir com as marcas e os seus responsáveis, participar em sessões dinâmicas e conhecer as histórias por trás de cada relógio. Houve também palestras, masterclasses, sessões de touch & feel, clínicas relojoeiras e — como não podia deixar de ser — algumas festas. Se, em Portugal, os Jáfumega cantavam «La dolce vita, que grande fita» nos anos 80, em Itália a vida real é mesmo doce…

No total, o After Time contou com a participação oficial de 26 marcas distintas, a maior parte jovens micromarcas que conviveram com alguns nomes consagrados — mas praticamente todas elas numa fasquia de preço muito convidativo, salvo algumas exceções. E, antes de um artigo futuro a escalpelizar os lançamentos e relógios que mais estiveram em destaque no evento, passámos em revista os quatro dias do certame transalpino.
Múltiplas ativações
O After Time 2025 incluiu várias ativações especiais que promoveram uma interessante dialética entre tradição e inovação. Por exemplo, o evento arrancou com a Noite de Abertura x Gagà Laboratorio — uma festa de inauguração na quinta-feira que deu o mote para os dias seguintes, com uma música, estilo e convivialidade. A performance de destaque do inimitável cançonetista Alessandro Ristori gerou uma atmosfera vibrante e inconfundivelmente italiana.

No dia seguinte, a Leica ofereceu uma envolvente masterclass de fotografia com Kristian Dowling, uma palestra esclarecedora com Andrea Pacella (Vice-Presidente Global de Marketing da Leica) e Stefan Ebner-Kaufmann, Diretor Executivo da Divisão de Relógios da Leica. O evento e a masterclass foram seguidos por exclusivo preview das coleções de relógios da marca fotográfica de culto que hoje em dia apresenta também uma coleção relojoeira deveras interessante, como a própria Espiral do Tempo já teve ocasião de o demonstrar num evento anfitriado no Porto. Dez sortudos participantes foram convidados a participar num workshop intimista apresentado pelo fotógrafo Kristian Dowling (a Espiral do Tempo também já apresentou no passado uma iniciativa do género com a Leica).

A emergente e excelente Ming fez uma primeira aparição em Itália, promovendo uma palestra com o CEO Praneeth Raj Singh sobre a sua tão peculiar filosofia de design, a jornada criativa desde os primórdios e a ousada abordagem à relojoaria moderna, seguida de um aperitivo e uma sessão touch & feel dos relógios da marca fundada pelo genial Ming Thein.

A noite de sexta-feira foi passada no estabelecimento Fortela, a boutique principal da plataforma de moda e estilo criada pelo lendário Alessandro Squarzi — e nessa noite foi apresentada a edição especial comemorativa Squale x Alessandro Squarzi, inspirada num histórico modelo de mergulho da Squale. Entre roupa com estilo e qualidade, centenas de estilosos convidados conviveram com cocktails da Martini na mão. O evento ofereceu aos presentes uma experiência imersiva no mundo de Alessandro Squarzi, explorando a sua visão de estilo, inspirações de design e o processo criativo por trás do relógio colaborativo.

A Fondation de l’Haute Horlogerie regressou a Milão, após a Milano Watch Week de 2024, para sediar um quiz relojoeiro interativo do tipo Trivial Pursuit no Terrazza Martini — unindo profissionais, colecionadores e entusiastas numa exploração lúdica e educativa da relojoaria, incorporando a missão do After Time de inspirar a próxima geração e partilhar o conhecimento relojoeiro. Uma sessão com momentos hilariantes!

A Zenith, em parceria com a maison Pisa 1940, transformou um dos patamares do Terrazza Martini numa Clínica Relojoeira — promovendo educativas sessões técnicas e uma experiência única para colecionadores e entusiastas mergulharem ainda mais na arte da relojoaria e descobrirem, sob um novo ângulo, os segredos da secular manufatura de Le Locle.

Para além disso, houve também After Time nas ruas de Milão com a promoção de um test drive por parte da Maserati — uma das várias entidades parceiras da organização. Em Itália, não podia faltar a associação mecânica da relojoaria ao automobilismo…
Marcas diferenciadas
Ou seja, o After Time by Milano Watch Week assumiu um formato menos convencional e mais interativo do que uma feira tradicional, com um enfoque especial na comunidade, cultura e criatividade — uma nova experiência de cultura relojoeira que uniu relojoaria contemporânea com arte, moda e design, sendo menos formal do que uma feira comercial e promovendo interações diretas e experiências únicas. Um ambiente de ‘estilo aperitivo’ que apresentou a relojoaria de uma forma acessível e envolvente.

A Milano Watch Week inaugural do ano passado já tinha atraído mais de 3.000 participantes de mais de 30 países. O After Time de 2025 ofereceu uma abordagem ainda mais intensa, vibrante e menos formal; o novo nome não surgiu por acaso porque a maioria das marcas envolvidas tinha também um perfil distinto — mais acessibilidade e mais espontaneidade ofereceram aos visitantes uma conexão, interação e narrativa social completamente diferentes.

O foco na acessibilidade foi traduzido pelo facto de a maioria das marcas envolvidas apresentar relógios superlativos por menos de 10.000 euros — mas sobretudo menos de 5.000 euros, com a média das notáveis micromarcas presentes a exibir modelos abaixo dos 2.500 euros no salão de exposições Rotonda del Pellegrini (Via delle Ore 3).

E houve mesmo jovens marcas que já atingiram um certo estatuto de culto, como a Dennison dos mostradores semipreciosos, a Furlan Marri de estilo neoclássico, a Serica e o seu perfume parisiense, a italiana Venezianico, a Beda’a, a M.A.D Editions (da MB&F, que promoveu um sorteio especial, oferecendo a oportunidade única de comprar um dos cobiçados M.A.D. 1 Slim na cor Azul ou o M.A.D. 2 na cor Verde), a De Rijke & Co, a Echo/Neutra, a Atelier Wen, a Arsène Lippens e a Space One no salão inferior, juntamente com a Louis Érard.

No andar superior conviveram marcas mais históricas, como a Oris e a sua diversificada oferta, a Raymond Weil com os Millesime em força, a Frederique Constant com complicações em destaque, a Doxa e o culto dos divers, a Wyler Vetta em parceria com a mítica marca italiana de motos MV Agusta, e a incontornável Seiko. Ao lado, no espaço da Via Santa Tecla 3, estiveram sediadas a Favre Leuba, a Nivada Grenchen e a Gagà Milano.

Em suma, um excelente final de semana com quatro animadas jornadas carregadas de relógios, estilo e sprezzatura. Em Portugal, continuamos à espera de vivenciar algo de parecido — é o (triste?) fado nacional…