Master Memovox: a joia secreta da Jaeger-LeCoultre

Tem classe, inclui uma especialidade, é diferenciado e apresenta o selo de uma mítica manufatura: se há um relógio com licença para despertar qualquer aficionado de sonhos e devaneios é seguramente o Master Memovox. Uma estória contada na primeira pessoa e que inclui a história completa de um modelo que pode ser considerado a joia secreta do catálogo atual da Grande Maison.

Sim, Robert Downey Jr foi receber o seu Óscar com o excelente Reverso Tribute Chronograph, uma das grandes estreias relojoeiras de 2023 e seguramente uma peça de exceção que qualquer aficionado desejaria ter. Eu próprio votei nele para Relógio do Ano de 2023. Mas o meu modelo preferido da Jaeger-LeCoultre, por razões bem pessoais, é outro e dificilmente faria parte das primeiras escolhas de qualquer outro analista. É o Master Memovox e, para mim, é uma joia quase secreta do catálogo da Grande Maison. Ah… e vale a pena recordar que tem um certo Max Büsser associado à sua génese!

A terceira geração do Master Memovox é a primeira com fundo transparente em vidro de safira | Fotos: Jaeger-LeCoultre

Memovox significa mesmo ‘Voz da Memória’, em latim — e a minha preferência tem precisamente a ver com uma espécie de regresso sonoro ao passado. Porque se havia um som que gostava de ouvir na minha adolescência era o toque de ‘feriado’ do Liceu José Falcão, em Coimbra. Quando o professor não comparecia cinco minutos depois do toque de chamada, a campainha tocava e gritávamos todos em uníssono: «Feriado!». E desaparecíamos num ápice, não fosse o lente chegar atrasado…

Hoje em dia, aqueles cinco anos entre 1979 e 1984 — do 7.º ao 11.º ano de escolaridade — vêm-me quase sempre à memória quando utilizo a função de alarme do meu Master Réveil, o primeiro dos meus quatro Jaeger-LeCoultre e o equivalente ao atual Master Memovox. O som é igual ao toque de ‘feriado’ do Liceu José Falcão, o que de certo modo ameniza o meu habitualmente péssimo despertar. Um som límpido, que tem a duração de 20 segundos (com a corda toda) e que é proporcionado por uma pequena maravilha da micromecânica e da metalurgia acústica.

Com o meu Master Réveil em frente à Jaeger-LeCoultre e o seu atual descendente direto Master Memovox | Fotos: Miguel Seabra/Espiral do Tempo

Devo confessar que, de entre todas as complicações da relojoaria tradicional, sempre foram as acústicas aquelas que mais me impressionaram — uma confissão que a minha tendência evidente pelos cronógrafos poderia rebater, mas é mesmo verdade: mais do que turbilhões, equações do tempo, calendários perpétuos e complicações quejandas, tenho uma profunda admiração por relógios dotados de repetições minutos e ainda mais por grandes sonneries e carrilhões. Pena é que essas complicações acústicas estejam algo aquém da bolsa do comum dos mortais… como eu, que me vou contentando (e muito) com um ‘simples’ alarme mecânico.

É simples, mas não tanto como isso. Apesar da mais popular linha retangular Reverso e de todas as suas fascinantes variações, o modelo dotado de alarme da linha redonda Master (ou Master Control 1000 Horas) sempre foi o primeiro relógio que quis ter da Jaeger-LeCoultre. Começando pelo seu sóbrio aspecto geral e qualidade intrínseca até à tal função alarme/despertador que tão difícil é de encontrar na indústria relojoeira e que tão útil ainda pode ser, embora a esmagadora maioria das pessoas utilize o smartphone para esse efeito.

De Moscovo a Basileia

Esquecendo os relógios de quartzo japoneses (sacrilégio!) que cheguei a usar na minha inconsciente adolescência, o meu primeiro relógio de pulso com despertador mecânico foi adquirido num terraço da Universidade de Moscovo que apresentava uma vista fabulosa sobre a capital russa. Estava lá para fazer a cobertura da final da Taça Davis de 1995 entre a Rússia e os Estados Unidos; tive sorte em os russos se qualificarem de novo para a final e jogarem em casa — tinha estado em Moscovo um ano antes para ver a Rússia perder com a Suécia e não me perdoei por não ter comprado nenhum relógio de fabrico soviético, que na altura estavam na moda. Lá consegui colmatar a lacuna: adquiri a um vendedor de rua um Imperator Rossia bicolor da Soviet por 12 dólares…

Não é muito bonito e o alarme mais parece um besouro em estado de moribundez até ao seu estertor final ao cabo de 14 segundos. E que necessitou de arranjo; o mestre Vítor Lopes, que então me aturava em visitas periódicas à Escola de Relojoaria da Casa Pia, lá me foi dizendo eufemisticamente que o mecanismo não era «grande espingarda» enquanto resolvia o problema. Ou seja, o Imperator Rossia está para o Master Memovox como um Volga para um Rolls Royce. Mas foram precisos cinco anos para aumentar a cilindrada!

O Master Réveil (disponível com correia ou bracelete) presente no catálogo da Jaeger-LeCoultre a partir de 1994 | Foto: Miguel Seabra/Espiral do Tempo

Foi na minha primeira visita à feira de Basileia (em 1996, para escrever um artigo para a revista de bordo da Portugália) que comecei a cobiçar o Master Réveil e a integrá-lo numa pequena lista de relógios de sonho — dois anos depois do modelo ter sido lançado e imediatamente eleito ‘Relógio do Ano’ pela imprensa especializada. Entretanto, fui materializando alguns nomes dessa lista, enquanto ia pedindo para ver e ouvir mais de perto o Master Réveil na extinta Lazúli Joalheiros (nas Amoreiras) ou na Torres Joalheiros (então na Rua do Ouro). Pelo meio, contentei-me em fazer o download do toque do relógio a partir do site da marca (www.jaeger-lecoultre.com) e visitar Le Sentier para tirar um primeiro mini-curso de relojoaria na Jaeger-LeCoultre em finais de 1999.

Finalmente, já com o preço substancialmente inflacionado desde a primeira vez que o vira, consegui finalmente o meu Master Réveil (nome então dado ao modelo automático do Master Memovox, a versão de corda manual do mesmo relógio; entretanto ficou apenas a designação histórica Memovox na versão automática) em junho de 2000. Estava de partida para Wimbledon e começou logo por me ser muito útil: para além de me ajudar a acordar, recordava-me sempre as horas de fazer a gravação das crónicas de ténis para a RFM — na sala de imprensa, já se riam quando ouviam o som cristalino…

O primeiro modelo Memovox, lançado na década de 50 | Foto: Jaeger-LeCoultre

E fui gostando cada vez mais do Master Réveil. «Um relógio para toda a vida», como me disse então um amigo meu — na altura era difícil encontrar um relógio com uma estética mais clássica, pura e intemporal. Gosto de relógios de forma, mas o Master Réveil é circular como o próprio tempo e a confortável caixa em aço polido da melhor qualidade (estanque a 50 metros) apresentava as proporções ideais para um formato redondo. O meu pulso não é grande, mas sempre detestei relógios extra-planos; para mim, o Master Réveil tem as dimensões ideais de um digno relógio masculino, com um diâmetro de 38,7 mm; a espessura de 13,5 mm pode ser considerada relevante, mas havia razões técnicas para isso: devido à massa oscilante e ao disco da data da versão automática, era um pouco maior e mais volumoso do que o parente Master Memovox (36 mm para 12 mm) de corda manual. Mas foram precisamente o maior volume, o caráter automático e a data que me levaram a preferir então o Master Réveil…

O Master Réveil de 1994 em versões de aço e ouro | Foto: Miguel Seabra/Espiral do Tempo

Por baixo do vidro de safira antirrisco, o mostrador argenté ligeiramente curvo é de grande classe e simplicidade. Os algarismos árabes e os índices das horas aplicados são em aço, tal como o caixilho da janela para a data; a marca e os minutos são pintados, com pontos luminescentes em tritium nas horas. Os ponteiros das horas e minutos são Dauphine (longos triângulos facetados com um traço luminescente no meio), e o ponteiro dos segundos é azulado. Ao centro encontra-se o disco giratório com o triângulo para a marcação da hora do alarme e a inscrição ‘Réveil’ (despertar, em francês). O conjunto é bem legível na escuridão, devido à qualidade do material luminescente…

As coroas, colocadas às 2 e às 4 horas, são de dimensões generosas para um fácil manuseamento e têm o logo ‘JL’ estilizado em relevo. A coroa que está às quatro horas é a de acerto da horas e minutos quando puxada; na sua posição habitual serve também para a carga e ainda não conheci um relógio automático que proporcionasse uma sensação e um som tão agradáveis no ato de dar corda. A coroa das 2 horas serve para dar corda manual ao alarme e, puxada, para ajustar a hora do toque.

Timbre perfeito

O fundo em aço do meu Master Réveil é aparafusado em quatro pontos com o belo e característico selo de ouro rosa em relevo (com o número da peça) da Série Master Control 1000 Horas, a garantia da Jaeger-LeCoultre que o relógio foi devidamente testado e corresponde aos mais elevados padrões de qualidade — mais até que os do Controlo Oficial Suíço de Cronometria. Os relógios Master Control são controlados o triplo do tempo, em mais posições e num maior número de testes do que aqueles que são submetidos ao COSC… para além do importante facto de os testes serem efectuados com o produto final, e não apenas com o mecanismo. A precisão está até acima dos padrões do COSC — mesmo que eu, adepto incondicional dos relógios mecânicos, não me importe muito com a precisão. Mesmo assim, na última vez que controlei o mecanismo a variação era de somente +1 segundo por dia!

Atualmente, considero quase obrigatório que um relógio mecânico tenha um fundo transparente para que o seu coração e alma sejam devidamente apreciados. Contrariamente ao seu ‘descendente’ atual Master Memovox, o Master Réveil não o tem — mas isso devia-se à especificidade do mecanismo e ao facto de o fundo ter de funcionar como caixa de ressonância para que a eficácia do alarme seja máxima. O minúsculo martelo faz vibrar o timbre suspenso na periferia do interior da caixa; a qualidade sonora é excelente (com uma frequência que agrada ao ouvido, nem demasiado baixa nem excessivamente elevada) devido à descoberta de uma liga especial e à invenção de uma forma especial para o tal timbre que faz recordar o liceu da minha juventude.

As três gerações do modelo Master Control automático com alarme: 1994, 2010 e 2020 | Foto: Miguel Seabra/Espiral do Tempo

Embora também pudesse optar por uma bracelete em aço na altura, escolhi obviamente uma correia em pele; a Jaeger-LeCoultre tinha então umas novas correias em pele de crocodilo da Luisiana preta ou castanha escura, mas pedi a correia em pele de avestruz com pespontos contrastantes por ser tão emblemática da marca nesses tempos. De qualquer modo, eu já sabia de antemão que seria um strapmonster: ou seja, um relógio que fica bem com qualquer correia de qualquer cor… algo de particularmente importante para um strapaholic como eu!

Outro aspeto que tive em conta foi o facto de ser um modelo da Jaeger-LeCoultre pouco vulgar e pouco visto. Quando lhe estava a ‘fazer a rodagem’ em Londres, passeei-me com ele pelas relojoarias de Regent Street e Old Bond Street e apreciei as exclamações de admiração dos lojistas (o Master Memovox de corda manual era então bem mais comum). E a exclusividade do mecanismo só lhe aumenta o valor intrínseco: os relógios-despertadores das restantes marcas eram praticamente todos equipados ou derivados de calibres Cricket da Vulcain, com som de besouro, e movimentos ‘new old stock’ Adolf Schild (o automático AS 5008 ou os manuais AS 1475 e AS 1930), que produzem um som claramente inferior e que, segundo um colega da altura, «dificilmente acordaria gente com sono leve». Já se sabe que as complicações acústicas são uma especialidade da casa Jaeger-LeCoultre, que parece deter o segredo da alquimia metalúrgica…

Memovox Polaris de 1968, o ícone que inspirou a coleção Polaris e Anúncio publicitário alusivo aos modelos Memovox e Polaris.
O histórico Memovox Polaris de 1968, o íconico relógio de mergulho com alarme que inspirou a atual coleção Polaris | Foto: Jaeger-LeCoultre

Em retrospetiva, o primeiro relógio de pulso com alarme na história da relojoaria remonta a 1876 e não teve sucessores. A Eterna lançou um modelo em 1914, mas a era de ouro dos alarmes de pulso mecânicos só começou em finais dos anos 1940 pela mão da Jaeger-LeCoultre e da Vulcain; em 1954, a A. Schild apresentava o popular Calibre AS 1475 — pouco depois de a Jaeger-LeCoultre registar, em 1953, o primeiro mecanismo automático com alarme de carga manual: o Calibre 815 ‘Memovox’, que depois foi aperfeiçoado no 825 (1959), 916 (1969) e no 918 (1994) que equipa o meu relógio. E que já foi radicalmente aperfeiçoado, com a terceira e mais recente geração do Master Memovox lançada em 2020.

O meu Master Réveil — ou seja, primeira geração automática do Master Memovox — tinha dois aspetos a melhorar: a mudança de data era lenta e, a seguir à descarga do toque de alarme, o relógio produzia um tilintar (a solução que uso para parar isso é simples: puxar a coroa do alarme!). O Calibre 918 de 1994 tinha 45 horas de reserva de carga e era formado por 260 componentes, dos quais 22 rubis; incluía um sistema anti-choque Kif, um balanço Glucydur de três braços que bate a 28.800 alternâncias/hora e espiral plana Nivarox 1 com regulação micrométrica Spirofin. A massa oscilante sobre rolamento de esferas era em ouro de 18 quilates na periferia, os parafusos azulados, a platina microjateada, as pontes aparadas em Anglage e a decoração em Côtes de Genève e Perlage.

A ‘remasterização’

Em 2020, a Jaeger-LeCoultre renovou a sua histórica linha Master Control com subtis afinações que lhe dão uma aura mais contemporânea sem perder o visual clássico de sempre. Para além da sua histórica reputação enquanto ‘manufatura das manufaturas’, a Jaeger-LeCoutre é sobretudo conhecida pelos dois históricos rostos da sua coleção: a fisionomia retangular do reversível Reverso e a faceta redonda dos Master Control. Ambos interpretam de maneira tão perfeita quanto distinta o discreto charme da Grande Maison, graças a elegantes criações que destilam classe através do equilíbrio das proporções e de uma requintada estética.

O mais recente Master Memovox | Foto: Susana Gasalho/Espiral do Tempo

A mais recente remodelação estrutural da linha Master Control foi apenas a segunda nas suas três décadas de vida. Os primeiros quatro modelos foram apresentados no contexto da Watches & Wonders, contemplando três exemplares tradicionais que há muito fazem parte do catálogo regular e uma declinação completamente inédita que logo assumiu o estatuto de estrela da companhia: o Master Chronograph Calendar, naturalmente protagonista perante as atualizações dos já conhecidos Master Géographique, Master Calendar e Master Date. No verão foi acrescentado o inevitável Master Memovox e também a especialidade Master Memovox Timer em edição limitada.

A linha Master Control nasceu no início dos anos 90, quando a manufatura era liderada por Henri-John Belmont — tendo como designer-chefe Janek Deleskiewicz e como responsável de produto um promissor jovem chamado… Max Büsser. Ao longo de três décadas, que incluíram sucessões diretivas, multiplicação de empregados, crescimento do edifício original até uma área mais de dez vezes superior e mudanças corporativas (absorção do grupo VDO Mannesman pela Richemont), a gama manteve-se sempre como paradigma da secular manufatura da Vallée de Joux — oferecendo grande qualidade e complicações úteis em modelos redondos e despretensiosos, a um preço relativamente acessível para tanto pedigree. A caminho do trigésimo aniversário, foi ‘remasterizada’ em 2020 numa terceira geração que tem tanto de inovação como de tradição. Com fiabilidade absoluta, traduzida numa especialmente extensa garantia de oito anos.

À esquerda: a segunda geração do Master Memovox (2010), com coroas mais achatadas; à direita: os modelos de 1994 e 2020 | Fotos: DR

O advento da linha Master Control inaugural em 1992 esteve precisamente associado a uma garantia de fiabilidade que lhe deu o nome e que surgia então gravado a ouro no fundo das caixas (mesmo que fossem em aço): o selo ‘1000 Hours Control’, uma certificação atribuída ao cabo de um milhar de horas de testes que veio cimentar ainda mais a excelente reputação da Jaeger-LeCoutre — numa altura em que os controlos de qualidade eram muito menos exigentes e sobretudo feitos sem que o mecanismo estivesse dentro da respetiva caixa do relógio, como sucede no mítico Contrôle Officiel Suisse des Chronomètres (COSC). A bateria de testes tinha uma duração de seis semanas e incidia sobre seis vertentes: resistência aos choques, regulação em diferentes posições, autonomia da reserva de corda, resistência às mudanças de temperatura, reprodução dos gestos quotidianos e estanqueidade. Hoje em dia, todos os relógios de todas as diversas linhas da manufatura passam pelo teste.

Códigos estéticos: detalhes do Master Calendar e do Master Date | Fotos: Jaeger-LeCoultre

«Precisávamos de uma nova coleção redonda, com caráter e que não se parecesse com os modelos que tínhamos na altura», recorda Max Büsser, que entretanto prosseguiu a carreira noutras paragens até fundar a MB&F e tornar-se numa estrela da relojoaria conceptual. «Estávamos então ainda longe da tendência neo-rétro de agora, mas fomos aos arquivos e inspirámo-nos em modelos clássicos para uma linha com caixas estanques um pouco mais espessas do que era então normal devido ao hábito dos relógios de quartzo. E mostradores curvados, que ninguém fazia na altura. A grande exigência do teste das mil horas fez-nos aprender muito, permitindo à Jaeger-LeCoultre fiabilizar incrivelmente a sua produção de movimentos mecânicos. A curva de aprendizagem foi extraordinária!».

Perfeito para o quotidiano

CEO da Jaeger-LeCoultre desde 2018, Catherine Rénier é bem conhecedora da importância da chancela Master Control no seu catálogo: «Estava na hora de renovar a linha. É fundamental para a marca, com relógios ideais para o quotidiano com o seu estilo casual e funções úteis. Fizemos um trabalho de fundo sobre a estética e sobre a técnica», sublinha. «Quisemos colocar de novo a linha Master Control na ribalta e simplificamos ao não juntar muitas mais referências. Mas apresentamos uma nova combinação de funções no Chrono Calendar e um novo pormenor com o salto do ponteiro da data no Master Calendar».

Relógio Jaeger-LeCoultre Master Control Chronograph Calendar deitado sob fundo azul.
Master Chronograph Calendar, o novo ponta de lança da linha Master Control | Foto: Jaeger-LeCoultre

Também Lionel Favre começou a trabalhar na manufatura de Le Sentier há seis anos, mergulhando diretamente no projeto. «Quisemos redesenhar a linha Master Control mas sem qualquer exigência que não fosse a de respeitar os códigos estéticos — a mudança mais evidente foi passar de flancos mais direitos na caixa para um perfil com proporções mais finas, de asas mais desenhadas e curvas», recorda o atual responsável de design da marca; «Reduzimos a largura da luneta, mantivemos a identidade do mostrador entre algarismos árabes e índexes, e trabalhámos muito nos acabamentos com subtis diferenças de tonalidades acinzentadas. Gosto do minimalismo eficiente, claro, de leitura fácil. A linha Master Control não tem um design de rotura; tem uma estética equilibrada, de tradição, inspirada nos anos 50, combinando um ligeiro espírito vintage com modernização em relógios elegantes que não são tão formais como os modelos Master Ultra Thin. A nova correia que ganha patina com o tempo também os ajuda a ter uma aura mais casual». E revelou: «O desenvolvimento da nova coleção durou dois anos e meio. Aproveitámos para melhorar os calibres com mais reserva de marcha até às 70 horas, materiais antimagnéticos, um bonito acabamento com rotores em ouro e maior precisão».

O Master Réveil no catálogo da Jaeger-LeCoultre em 1994 | Foto: Miguel Seabra/Espiral do Tempo

Stéphane Belmont é filho do antigo CEO que lançou o conceito Master Control e tem a seu cargo o departamento de património da manufatura de Le Sentier. «O Calibre 889 nasceu nos anos 80 e é um super calibre, muito plano; foi nele que assentou a primeira linha Master Control. Depois do período de domínio do quartzo, os relógios mecânicos voltaram a ser mais procurados e pensava-se que o seu futuro passava pela fiabilidade, robustez e facilidade de utilização. Como os testes do COSC incidiam apenas sobre o movimento e em posição estática, a Jaeger-LeCoultre resolveu desenvolver uma bateria de testes mais dinâmica. Para dar relevo ao controlo das 1000 horas, foi criado um selo em ouro soldado ao fundo das caixas; depois houve versões com o selo num fundo de dobradiças com tampa que se abria para revelar o movimento e a partir de certa altura todos os relógios começaram a ter o fundo transparente em vidro de safira, porque era o que os clientes desejavam. Por uma questão de ressonância do alarme, apenas o Master Memovox/Master Réveil tinha o fundo fechado… mas já deixou de o ter».

A nova geração

Em 2020, a dinastia Master Control ressurgiu em força e afinada em todas as suas vertentes, embora mantendo uma inconfundível identidade que remete para grandes clássicos da Grande Maison na década de 50 como o Futurematic, o Powermatic e o Memovox. No plano estético, as caixas redondas apresentam um diâmetro único de 40 milímetros que acaba por ser o mais consensual para todos os gostos e todos os pulsos, enquanto as da geração anterior andavam entre os 39 e os 40mm de diâmetro.

As três gerações (1994, 2010, 2020) lado a lado | Foto: Susana Gasalho/Espiral do Tempo

A grande mudança visual surge no perfil, bem mais elegante do que a segunda geração de 2010. A luneta é mais fina e inclinada para a borda, as asas são mais curvas e anatómicas, os flancos escovados alternam com as superfícies polidas; apliques em relevo, acabamento raiado nos mostradores e ainda ponteiros principais Dauphine e secundários em tom azul também fazem parte do código genético da coleção. A identidade fica completa com as indicações gravadas em baixo relevo no fundo com centro em vidro de safira, que permite ver a arquitetura e a decoração dos calibres automáticos totalmente concebidos na manufatura.

Disponíveis em aço ou numa nova liga patenteada de ouro rosa com paládio denominada Le Grand Rose Gold, o quinteto (mais um modelo suplementar) da nova geração Master Control incluiu então o ‘novo’ Master Memovox.

Memovox contemporâneo

Os alarmes mecânicos são uma das muitas especialidades da Jaeger-LeCoultre e a nomenclatura que em latim significa ‘voz da memória’ entrou para o catálogo da marca na década de 50. O primeiro modelo incluído na linha Master Control surgiu em 1994 sob o nome Master Réveil com corda automática e em 1998 apareceu a versão Master Memovox de corda manual; a segunda geração foi lançada em 2010 sob a designação unificada Master Memovox e movimento automático.

A segunda geração (de 2010, aqui na versão em ouro) tinha um perfil mais ‘cheio’ do que as de 1994 e de 2020 | Foto: Paulo Pires/Espiral do Tempo

Estreado em 2020, o novo Master Memovox apresenta-se com significativas diferenças no Calibre 956 de carga automática, antigamente escondido sob um fundo fechado para melhor funcionar como caixa de ressonância: em vez de preso ao interior da tampa, o gongo está agora na periferia e permite um fundo transparente em vidro de safira. O som cristalino continua a evocar o toque das velhas escolas — e do meu antigo Liceu José Falcão — durante 19 segundos e o tempo do alarme é determinado pelo disco central, controlado pela coroa às 2 horas (que também dá corda manual ao alarme).

Detalhe do mostrador do novo Master Memovox | Foto: Susana Gasalho/Espiral do Tempo

Simultaneamente, foi também lançada uma edição limitada (250 exemplares) do Master Memovox Timer — exclusivamente em aço, com mostrador azul e centro prateado contrastante com algarismos em relevo. A habitual função de alarme surge complementada por um inédito dispositivo que faz soar a função acústica no final de uma contagem decrescente; trata-se de uma animação no espírito das variantes Memovox Parking e Universelle dos anos 50.

Adereço de correaria

Para complementar o visual caraterístico da nova geração Master Control, vale a pena fazer uma referência às novas correias utilizadas — que proporcionam um look diferenciado graças à tonalidade mel e desenho específico do pespontado. Foram pensadas para realçar a elegância casual das caixas em aço e são feitas em calfe Novonappa, sendo manufaturadas em França com o recurso a um tingimento vegetal específico que preserva a textura original da pele e favorece a patina ao longo do tempo. Para mais, o sistema Presto Spring permite uma troca rápida de correia e do próprio fecho de báscula sem o recurso a qualquer utensílio ou ferramenta — um pormenor extremamente importante para quem gosta de personalizar os seus relógios com trocas frequentes de adereço.

A terceira geração é esteticamente mais parecida com a primeira geração (em primeiro plano) | Foto: Miguel Seabra

O Master Memovox está obviamente dotado de uma correia Novonappa. Já a variante em ouro Le Grand Rose vem equipada de origem com uma correia em pele de aligátor de cor chocolate, mas também ficam bem com correias Novonappa para um efeito menos formal. Aliás, todos os relógios Master Control ficam bem com qualquer tipo ou cor de correia e em qualquer circunstância; é o relógio intemporal que devia ser obrigatório para qualquer aficionado!

Com o meu Master Réveil e uma bracelete NATO inspirada no ténis | Foto: Miguel Seabra/Espiral do Tempo

No caso especifico do Master Memovox, as valências técnicas e estéticas fazem dele uma verdadeira jóia ‘escondida’ no catálogo da Jaeger-LeCoultre e apresentam uma classe condizente com o relógio — descendente direto do meu querido Master Réveil que é, repito, um dos relógios preferidos da minha coleção e era o único que deixava acordar-me dos meus sonhos ou interromper as minhas divagações… até lhe juntar o Master Compressor Extreme World Alarm ‘Tides of Time’, igualmente da Jaeger-LeCoultre e com a mesma complicação acústica associada a um worldtimer. Aos pares é sempre melhor!

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